PUBLICAÇÃO DO CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Nº 120 - FEV-MAR / 2015
O “voo” dos microrganismos
Técnica MALDI-TOF permite que o tempo de identificação do agente etiológico de infecções caia de 24 horas para um minuto e meio
Nada melhor do que ter em mãos o resultado de um exame para decidir qual o tratamento medicamentoso mais adequado. Os métodos biológicos tradicionais para identificação da maioria dos agentes infecciosos, entre os quais bactérias e fungos, envolvem provas bioquímicas com análises dos fenótipos. Dependendo do caso, a identificação pode levar até 24 horas, o que muitas vezes atrasa a liberação do laudo e prejudica a terapia antimicrobiana.
Para diminuir esse problema, uma nova tecnologia está revolucionando a forma de identificação de fungos e bactérias nos laboratórios clínicos. Trata-se da técnica MALDI-TOF. Em inglês, a sigla significa a abreviatura de matrix assisted laser desorption/ionization time-of-flight; em português, ionização/dessorção de matriz assistida por laser/tempo de “voo”. O equipamento é um espectrômetro de massa, que detecta moléculas de massa maior, como as proteínas.
A cepa do microrganismo a ser identificada é colocada em uma placa chamada slide. Quando a suspeita é de bactéria, é adicionado o alfa-cyano-4-hidroxycinnamic acid (CHCA), chamado de Matrix. Já quando é de levedura, é adicionado o ácido fórmico. Em seguida, o slide é colocado no equipamento, no qual cada cepa é atingida pelo laser. A incidência do laser fará com que o microrganismo literalmente voe. O tempo de voo (time-of-flight) se traduzirá em picos de massa e identificará o microrganismo.
Segundo a dra. Ana Paula Timm Lobo, farmacêutica e supervisora do setor de microbiologia hospitalar da AFIP Medicina Diagnóstica, essa técnica é utilizada para inúmeras análises e, no laboratório de microbiologia, especialmente para a identificação de bactérias e leveduras.
Dra. Ana Paula destaca alguns benefícios da técnica. Segundo ela, a MALDI-TOF tem baixo custo. Mesmo que o investimento inicial do laboratório seja alto, o gasto para cada identificação é baixo e compensa. “Além de a técnica ser simples, fácil e rápida, é possível identificar uma bactéria ou leveduras em torno de um minuto e meio, já os métodos tradicionais demoram de 18 a 24 horas”, explica.
Para atuar com a técnica, o profissional deve ser treinado pela empresa fabricante do equipamento. Dra. Ana Paula destaca quais os diferenciais do farmacêutico para atuar com a MALDI-TOF. “A formação acadêmica do profissional o habilita a trabalhar com espectrometria, por ter disciplinas na grade curricular que o preparam para tal. Mas hoje, nos laboratórios, quem realiza o método são técnicos e auxiliares. Os farmacêuticos analisam o resultado e assinam o exame.”
Apenas um ponto negativo envolve a utilização da MALDI-TOF: a técnica não obtém parâmetros para antibiograma, o que deve ser feito manualmente ou por outro método automatizado. A espectrometria dá indicações e diretrizes ao microbiologista referentes a resistências intrínsecas da bactéria. Dra. Ana Paula chama a atenção para a identificação de bactérias e leveduras. “Por MALDI-TOF, ela é feita a partir do crescimento do microrganismo em meios de cultura específicos. A identificação de bactérias e leveduras por MALDI-TOF diretamente do material biológico (urina, sangue, etc) ainda está sendo estudada.”
PRÊMIO NOBEL
Koichi Tanaka (Shimadzu Corporation – Kyoto/Japão) ganhou o Prêmio Nobel 2002 em Química por desenvolver o método de ionização/dessorção para análises de espectrometria de massa em macromoléculas biológicas. O princípio se tornou fundamental nos métodos padrões (MALDI, SELDI e DIOS) para análise estrutural de peptídeos, proteínas e carboidratos, o que torna possível a determinação rápida do conteúdo da proteína da célula intacta e do tecido vivo.
Pesquisadores do The Methodist Hospital, em Houston, Estados Unidos, relataram as vantagens que obtiveram com a implementação do MALDI-TOF, em estudo publicado em 2012, realizado diretamente das garrafas de hemoculturas assinaladas pelo equipamento como positivas. O estudo teve dois momentos, um antes da implementação do MALDI-TOF e outro depois. Foi estudado um total de 317 pacientes.
Ao estudar o custo-benefício da nova metodologia, os autores destacaram os resultados encurtando o tempo para a identificação, o que refletiu em benefícios clínicos para o paciente, já que tornou mais rápida a implementação de antibióticos específicos em substituição à antibioticoterapia empírica, além de reduzir custos hospitalares.
Os pesquisadores observaram a diminuição do tempo médio de permanência no hospital de três dias, o que resultou em redução de quase US$ 20 mil por episódio. Esses benefícios demonstraram que o método MALDI-TOF trouxe vantagens consideráveis, tanto na clínica como parte do custo dos cuidados de saúde.
Por Thais Noronha