Hidrogel brasileiro contra o câncer

 

Pesquisa brasileira desenvolve hidrogel tópico utilizando Viscum album com excelente potencial para tratamento oncológico

A formulação utiliza como princípio ativo o extrato etanólico liofilizado da planta europeia Viscum albumSão Paulo, 6 de junho de 2023. 

Uma pesquisa conduzida por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em parceria com colaboradores suíços da ISCADOR AG, Society for Cancer Research (VFK), Hiscia Institute, e da Universidade Federal Fluminense (UFF), desenvolveu um hidrogel de liberação tópica ou transdérmica, visando o tratamento de lesões cutâneas (oncológicas ou não), assim como para dores articulares localizadas.

A formulação utiliza como princípio ativo o extrato etanólico liofilizado da planta europeia Viscum album, espécie vegetal amplamente utilizada no tratamento complementar do câncer na forma injetável. O desenvolvimento deste produto visa acrescentar uma nova forma de apresentação destes extratos em adição ao tratamento convencial que utiliza a via injetável e que existe há décadas.

O Viscum album é uma planta semiparasita da família Santalaceae com larga distribuição na Europa e na Ásia, que tem sido utilizada há mais de cem anos na medicina integrativa para o tratamento de diferentes doenças, incluindo o câncer, principalmente na forma de extratos aquosos injetáveis. O uso popular de extratos etanólicos de Viscum também é igualmente tradicional no tratamento da hipertensão arterial, na forma de tinturas mães e preparações homeopáticas, de uso oral.

Segundo a Dra. Carla Holandino, pesquisadora responsável por este estudo e docente coordenadora do Laboratório de Pesquisa & Desenvolvimento de Práticas Integrativas e Complementares (LabPICs) da Faculdade de Farmácia da UFRJ, a forma de apresentação mais comum dos extratos aquosos do Viscum album é a injetável, através da administração subcutânea. Entretanto, o uso de injeções em geral tem menor adesão dos pacientes e, no caso de crianças, por exemplo, torna-se um empecilho a mais.Dra. Carla Holandino, pesquisadora responsável pelo estudo, docente coordenadora do Laboratório de Pesquisa & Desenvolvimento de Práticas Integrativas e Complementares (LabPICs) da Faculdade de Farmácia da UFRJ

“Foi pensando nestes pacientes e nas exigências técnicas e sanitárias inerentes às preparações injetáveis, que as tornam formulações bem mais caras, que desenvolvemos uma nova forma de apresentar os extratos etanólicos de Viscum, tendo a pele como órgão alvo. Desta forma, uma formulação transdérmica destinada a ser aplicada topicamente, foi preparada utilizando um polímero farmacêutico termo-sensível como veículo principal da formulação. Nossa pesquisa vem mostrando a eficácia desta formulação em tumores in vitro (células tumorais de diferentes linhagens) e os experimentos de permeação confirmaram o potencial transdérmico deste novo produto” explicou a pesquisadora.

Como exemplo dos preparados de V. album, aqueles oriundos da árvore hospedeira Malus domestica (macieira), vem se mostrando muito eficazes em mulheres com tumores no abdômen, enquanto o Viscum, que cresce no carvalho (Quercus sp), produz melhores resultados em homens que possuem tumores em órgãos internos. A pesquisa desenvolvida em parceria com a Suíça mostrou pela primeira vez a influência das árvores hospedeiras na composição fitoquímica desses extratos, através do estudo da metabolômica de extratos aquosos e alcoólicos de Viscum album coletados de diferentes árvores hospedeiras localizadas em distintos solos europeus e em estações do ano diferentes (verão e inverno).

Segundo a Dra. Carla, o tratamento traz muitos benefícios ao paciente oncológico. “Além das características atraentes inerentes aos produtos naturais derivados de plantas, alguns estudos indicam que a citotoxicidade dos extratos de Viscum é mais pronunciada nas células tumorais, quando comparada às células normais, o que torna estes extratos ainda mais interessantes, do ponto de vista clínico. Adicionalmente, sabe-se também que a associação destes extratos aos tratamentos convencionais (radio, quimio e radio-quimioterapia) melhora as taxas de sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes oncológicos. Por isso, a Viscum terapia tem sido utilizada de maneira integrativa, sem qualquer prejuízo aos pacientes. Além disso, os extratos de Viscum possuem atividade imunoestimulante, sendo esta terapia uma forte aliada no tratamento de pacientes com doenças crônicas”, enumerou.

Além da indicação para o tratamento de lesões de pele oncológicas ou não, como a queratose actínica, alguns experimentos pilotos tem mostrado o promissor potencial terapêutico desta formulação para diminuição de dores articulares e para o tratamento de processos inflamatórios localizados.O Viscum album é uma planta semiparasita da família Santalaceae com larga distribuição na Europa e na Ásia

A pesquisa foi iniciada em 2018 e envolveu estudos químicos de caracterização dos extratos, coletas da planta considerando as sazonalidades e os diferentes hospedeiros, além dos experimentos in vitro com cultura de células tumorais e normais. Durante o projeto, Dra. Carla considera que o estudo foi conduzido dentro das especificidades inerentes aos projetos de pesquisa, onde metodologias precisas e robustas precisam ser desenvolvidas para que as hipóteses sejam comprovadas. “Não considero esta pesquisa com o status de concluída, uma vez que ainda precisamos comprovar os efeitos desta formulação em animais e em humanos. Para tanto, novos projetos encontram-se em desenvolvimento buscando confirmar os promissores resultados in vitro já obtidos”, acrescentou.

Por essa razão, o hidrogel de extrato etanólico de Viscum album ainda não está disponível para a comercialização. A manipulação do produto é sempre feita na UFRJ, sob a responsabilidade dos farmacêuticos pesquisadores do grupo. No entanto, a publicação dos promissores resultados in vitro, a divulgação dos resultados através de dissertações e teses, vem ampliando a visibilidade e aumentando o interesse da comunidade científica pela formulação.

“Nossa expectativa é a de aprovarmos em breve a patente deste hidrogel, a qual foi solicitada em 2019 ao INPI (Brasil). Enquanto isso, temos avançado com a pesquisa acadêmica em torno dos mecanismos de ação responsáveis pela atividade terapêutica da formulação, além de abrir caminhos que garantam a comercialização do produto no Brasil e no mundo. Recentemente, fomos procurados por um grande laboratório industrial homeopático brasileiro, que se mostrou interessado em comercializar o nosso hidrogel. Estamos convictos de que esta nova forma de apresentação dos extratos alcoólicos de Viscum album possui um potencial incrível para a medicina humana e animal”, concluiu.

Carlos Nascimento
Departamento de Comunicação CRF-SP

 

 

 

 

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