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CLIPPING - 10/07/2015

Assessoria de Comunicação do CRF-SP

 

O projeto de lei que pretende acabar com a demora nos testes de novos remédios

09/07/2015 - SBOC


Um novo medicamento só chega ao mercado se for testado em milhares de pessoas e, quase sempre, em vários países. é uma exigência básica de entidades regulatórias como a Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, ou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no Brasil. Se não conseguir incluir um número adequado de pacientes nesses estudos clínicos, a indústria farmacêutica não produz - e não lucra. Ela é a primeira interessada em realizar testes em humanos com rapidez. Mas não é a única. A pesquisa clínica traz desenvolvimento científico aos investigadores (médicos e outros profissionais), recursos financeiros às instituições públicas ou privadas onde ela é realizada e oportunidade de tratamento aos pacientes. Para muitos, ser voluntário é a única chance de receber atendimento adequado e acesso a um medicamento promissor, quando os remédios disponíveis deixam de funcionar.

Os milhares de pesquisas clínicas rea-lizadas no Brasil não são regidos por lei. As normas são ditadas pela Comissão Nacional de ética em Pesquisa (Conep), órgão ligado ao Conselho Nacional de Saúde. Um novo projeto de lei, apresentado em abril pelos senadores Ana Amélia (PP-RS), Waldemir Moka (PMDB--MS) e Walter Pinheiro (PT-BA), pretende regulamentar a atividade. O tema foi debatido numa audiência pública em março do ano passado. "Chegamos ao consenso de que havia lentidão na análise dos processos e de que era necessário criar um marco regulatório", diz a senadora Ana Amélia. "O projeto é um primeiro passo na busca de aperfeiçoamento da pesquisa clínica." O texto, apoiado pelas empresas e por grande parte dos pesquisadores, desagrada a Conep e outras entidades, como a Sociedade Brasileira de Bioética.

A dificuldade de aprovação de estudos clínicos é uma reclamação recorrente das empresas e dos cientistas há pelo menos oito anos. Segundo a Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), um estudo chega a levar um ano para ser aprovado no Brasil - bem mais que em outros países (dois meses nos Estados Unidos, seis no Reino Unido, sete na Argentina). Um levantamento realizado pela entidade em março revelou que, nos quatros meses anteriores, sete multinacionais haviam desistido de realizar 16 estudos no país de drogas contra o câncer, doenças raras, diabetes e esclerose múltipla. Não foi por falta de interesse. A diversidade genética da população e a qualidade dos investigadores das ilhas de excelência em pesquisa fazem do Brasil um dos países mais atrativos para a realização de estudos clínicos - apesar das condições regulatórias desfavoráveis. A lentidão na análise dos processos impede o cumprimento dos prazos internacionais. A razão é a exigência de avaliação dos projetos em duas ou até três instâncias: o comitê de ética da instituição de pesquisa, a Conep (quando a empresa patrocinadora é estrangeira) e a Anvisa (se a droga ainda não estiver aprovada no Brasil). Nos Estados Unidos e na maioria dos países, o processo ocorre em apenas duas: o comitê de ética e a agência regulatória.

"O projeto de lei é um sinal de desespero, uma tentativa de que se abra uma negociação sobre um tema que prejudica os pacientes e a ciência no Brasil", afirma Antônio Britto, jornalista e ex--governador do Rio Grande do Sul, que atualmente é o presidente executivo da Interfarma. "Não queremos diminuir a ética nem em um milímetro, mas precisamos aprovar os estudos com celeridade", diz o oncologista Paulo Hoff, diretor clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp). O 12º andar do maior hospital oncológico da América Latina abriga 54 estudos patrocinados pela indústria. Em alguns casos, o valor dos contratos com as empresas é mais que suficiente para financiar todo o trabalho. "Quando isso acontece, usamos a verba excedente para realizar projetos de interesse da instituição que não recebem patrocínio", diz Hoff. Os testes são disputados pelos pacientes. Entre 2008 e 2014, mais de 1.000 doentes foram tratados com drogas não oferecidas pelo SUS. Quarenta e quatro receberam o remédio ipilimumabe, contra o melanoma, cujo tratamento custa R$ 400 mil por ano.

Numa carta encaminhada aos comitês de ética das instituições de pesquisa, a Conep afirma que o projeto de lei ameaça os direitos dos pacientes. "é um desserviço à sociedade brasileira", diz o médico Jorge Venancio, coordenador da Conep. Uma das críticas diz respeito à perda do direito de continuar recebendo o medicamento quando o estudo termina. O projeto propõe que a empresa seja autorizada a fornecer o remédio apenas se a interrupção implicar risco de morte ou piora relevante do estado de saúde do doente - e se não houver alternativa de tratamento no Brasil. A ampliação do uso de placebo (pílulas sem efeito terapêutico) é outro aspecto controverso. Atualmente não é permitido oferecê-lo a um voluntário se existir tratamento para a doença que se pretende investigar. Pelo novo texto, o recurso pode ser adotado, desde que haja justificativa científica. Outra mudança é a criação de comitês de ética independentes. Isso abre a possibilidade de que a ética dos projetos seja julgada por comitês financiados pela indústria ou por associações de pacientes ligados a ela - o que representaria um claro conflito de interesses. "A Conep está fazendo um carnaval porque não se dispôs a ter um protagonismo para resolver o problema", diz a senadora Ana Amélia. Todos perdem com a burocracia. Mudanças são tão necessárias quanto o respeito aos voluntários.




Remédio contra sífilis está em falta no país

10/07/2015 - O Globo


A penicilina benzatina, que trata a sífilis e outras infecções, continua faltando no Brasil. A compra do medicamento é de responsabilidade dos municípios e estados, que contam com subsídio federal. Este mês, o estoque no país ainda pode ter um respiro. A expectativa do Ministério da Saúde é ter 1,2 milhão de ampolas, que suprem a demanda mensal nacional, disponíveis para a venda para o mercado público e privado. O problema é que não há garantia da mesma oferta para os meses seguintes.

O antibiótico está em falta desde o ano passado no país. A Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro informou que, hoje, não tem estoque e que todas as licitações para a compra do insumo terminam "desertas", sem oferta. E que, para sífilis congênita e febre reumática, os hospitais fazem compras pontuais, emergenciais, pois não há substituição terapêutica. Já a Secretaria Municipal não informou a capacidade do estoque e em quais unidades o medicamento está em falta. Afirmou que a utilização dos "estoques reduzidos é para os casos prioritários."

O ministério explicou que o problema é resultado da escassez mundial no suprimento de matéria-prima. Essa situação atingiu, principalmente, a Eurofarma, que importava insumos de áustria e China, e cuja produção é estimada em 500 mil doses ( seu mercado é basicamente doméstico).

Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), além da Eurofarma, existem outras três empresas com registro para produzir a penicilina benzatina: Fundação para o Remédio Popular ( Furp), Teuto Brasileiro e Novafarma. Mas dessas, apenas duas, a Eurofarma (Benzetacil) e a Teuto (Bepeden), venderam seus remédios em 2015. A Anvisa nformou ainda que, em janeiro, recebeu notificação da Novafarma sobre a "descontinuação temporária" do medicamento.

A Eurofarma informou ao GLOBO que há pouco voltou a produzir "com sua capacidade máxima". Isso porque, desde setembro, passou a importar matéria-prima de novo fornecedor estrangeiro, após homologação da Anvisa. Já a Teuto, cujo mercado é o hospitalar, nega a crise e informou que a produção "encontra-se dentro da normalidade".

No Instituto Fernandes Figueira, centro de referência no Rio no atendimento à mulher, a medicação acabou no no mês passado.

- Não temos mais - admitiu o vice-diretor Carlos Eduardo Figueiredo, que contorna a situação com remédios alternativos, seguindo o protocolo do Ministério da Saúde. - Mas para sífilis é mais complicado. Principalmente no caso das grávidas, porque elas não podem tomar a medicação alternativa. Além disso, para os demais casos, o tratamento alternativo se torna mais longo, caro, e a tolerância para adultos é pior. O remédio causa náuseas, por exemplo, e a adesão cai.

A preocupação em relação à doença está ligada, principalmente, aos casos de mortes de bebês com sífilis congênita, que quase triplicou entre os anos de 2008 e 2013. Em 2013, houve 161 óbitos de crianças com menos de um ano e foram registradas 21.382 gestantes com a doença.




PREçOS EXORBITANTES DIFICULTAM ACESSO A TERAPIAS

09/07/2015 - O Globo


O câncer cobra dobrado. Há o custo emocional, o do estigma. E há o preço altíssimo das novas terapias. Tão alto que países do mundo inteiro discutem como resolver. Carlos Gil representa a América Latina no Fórum Mundial sobre Acesso a Medicamentos, que acontece esta semana em Tóquio, com participação da Organização Mundial de Saúde (OMS). Os novos tratamentos contra o câncer custam, em média, entre US$ 10 mil e US$ 30 mil por mês - no Brasil, mais ainda devido aos gastos com advogado e importação. Um preço alto demais até para as maiores economias do mundo.

- Como um médico pode dizer ao paciente, "você tem cura, mas não tem dinheiro para se salvar"? Convivemos com isso todos os dias - diz Gil.

A cobrança emocional chega antes, com a descoberta da doença. Costuma ser pior para os pacientes mais jovens. Muitos não contam para os filhos, ocultam dos patrões.

- As pessoas têm medo se expor. Muitas vezes, justificadamente. Há o estigma da decadência física, muito pior na nossa sociedade que supervaloriza o corpo. Os pacientes têm medo de mostrar fragilidade. As coisas têm melhorado, à medida que a medicina avança, mas há muito o que resolver.

Carlos Gil se recorda do caso de um executivo que perdeu o emprego numa multinacional da área de petróleo, pois o diretor executivo da companhia temia que sua doença causasse incertezas em clientes e parceiros. Por casos assim, Melissa, que é designer, prefere manter o nome verdadeiro privado. E pelo mesmo motivo acha importante discutir a doença.

- O câncer é extremamente comum e ninguém está a salvo. Não adianta fingir que ele não existe. Nossa sociedade precisa tratar a doença com maturidade - afirma ela. Opinião semelhante tem Flavia Maoli. - Descobrir o câncer nos tira autoestima. Brigar com ele devolve a autoconfiança e revela uma força que não imaginávamos ter - frisa.

Se o estigma é o primeiro a surgir, o obstáculo dos preços estratosféricos não demora a aparecer. O custo do diagnóstico molecular caiu muito nos últimos tempos - de US$ 100 mil há 15 anos para cerca de US$ 1 mil (no Brasil, entre R$ 3 mil e R$ 4 mil, dependendo do caso). E ainda assim é inacessível à maioria da população. O tratamento, todavia, continua nas alturas. No preço de uma droga de sucesso está embutido o prejuízo do fracasso das que não foram adiante.

As novas tecnologias trouxeram esperança, mas também criaram castas. Há três tipos de pacientes, diz Gil. O mais raro é aquele que pode pagar e até viajar para o exterior. Grupo basicamente restrito a milionários. O segundo é aquele que pode pagar um advogado. O terceiro e imensamente maior é composto por aqueles que nem sabem que há terapias que podem salvar sua vida.

- é muito injusto. O retrato da desigualdade - destaca o oncologista.

A mensagem da Sociedade Americana de Oncologia Clínica, em seu último congresso, foi bem clara: ou o preço baixa ou ninguém terá acesso dentro de alguns anos. A sociedade lançou no fim de junho uma metodologia para os médicos avaliarem se vale a pena dar a um paciente um tratamento que pode ou não funcionar. A iniciativa, porém, gerou mais dúvidas do que resultados. Uma nova droga pode melhorar radicalmente a qualidade de vida, mas não prolongar o tempo que a pessoa viverá. Como resolver esses casos? Não há resposta.

Enquanto isso, resta aos pacientes recorrer à Justiça. A advogada de Porto Alegre Tamara Granitoff, que assistiu Flavia Maoli, atende a outras pessoas na mesma situação e diz que a burocracia é imensa. E os casos precisam ser muito bem fundamentados pelos médicos. O processo todo leva cerca de 50 dias.




Uso de cocaína potencializa infecção pelo HIV, aponta pesquisa

09/07/2015 - Folha de S.Paulo


O uso de cocaína acelera o processo de infecção do organismo pelo HIV, afirma estudo feito na Universidade da Califórnia em Los Angeles e publicado no periódico científico "Scientific Reports".

Ratos que receberam cocaína injetável e foram expostos à contaminação pelo HIV apresentaram teste positivo para o vírus duas vezes mais do que os animais do grupo controle (que foram contaminados pelo HIV mas não receberam cocaína).

Além disso, a quantidade de HIV presente nas células sanguíneas do grupo que recebeu a droga foi cerca de três vezes maior do que nos ratos do grupo controle.

"A pesquisa sistematiza uma correlação que na prática já era percebida. é comum que usuários de cocaína tenham sistemas imunológicos debilitados pelo uso da droga, ficando mais vulneráveis a diversas doenças", afirma Wagner Mendonça de Morais, psicólogo e coordenador da Estratégia de Redução de Danos de Aracaju. "Isso se traduz numa preocupação com as práticas de risco, como o compartilhamento de seringas", diz.

Se portadores de HIV ficam mais vulneráveis à progressão da doença ao utilizarem cocaína e por isso apresentam maior quantidade do vírus no sangue, eles têm, portanto, maior probabilidade de infectar outras pessoas.

Estudos anteriores já haviam estabelecido a relação entre cocaína e infecção acelerada pelo HIV em células sanguíneas humanas isoladas (estudos in vitro) e até mesmo em ratos.

A nova pesquisa estende suas conclusões para os efeitos da cocaína no corpo humano, já que foram usados ratos "humanizados", ou seja, geneticamente modificados para apresentar um sistema imunológico semelhante ao de humanos.

"O próximo passo será determinar como a cocaína interfere com as terapias antivirais usadas por portadores do HIV e investigar o impacto de outras drogas na progressão da doença", disse à Folha Dimitrios Vatakis, líder da pesquisa.




A rede capaz de conectar cérebros

10/07/2015 - O Globo


Duas cabeças pensam melhor do que uma. Seguindo esta máxima, o que poderia acontecer se conectássemos cérebros de diferentes indivíduos numa única rede? Coordenado pelo brasileiro Miguel Nicolelis, que costuma perseguir ideias típicas de ficção científica, um novo projeto mostrou ser possível interligar as atividades cerebrais de animais para que eles desempenhem tarefas conjuntamente.

Essa experiência, que ele chamou de "Brainet", ou rede cerebral, ganhou ontem dois artigos na revista científica "Scientific Reports", ligada à "Nature". Coordenador Centro de Neuroengenharia da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, Nicolelis direciona suas pesquisas para a reabilitação de pessoas com paralisia, e esse experimento não seria diferente. Na prática, o que ele espera no futuro é que profissionais de saúde possam ajudar mentalmente pacientes em recuperação.

- Estamos pensando em combinar a atividade elétrica de pacientes neurológicos com a de seus fisioterapeutas ou familiares. Seria uma forma de facilitar o treinamento e o esforço do indivíduo - explicou o neurocientista ao GLOBO. - é uma mudança completa de paradigma de reabilitação, porque em vez de atuar nos ossos ou nas articulações, o profissional iria colaborar mentalmente.

Há mais de 20 anos Nicolelis vem desenvolvendo pesquisas que seguem a linha da interface cérebro-máquina (ICM), um conjunto de sistemas computacionais que permite a indivíduos usarem sinais cerebrais para controlar movimentos de equipamentos artificiais, como braços robóticos, exoesqueletos e avatares virtuais. Desta vez, ele e sua equipe chegaram a um modelo integrado.

- Nunca tínhamos usado este conceito de interface cérebro- máquina compartilhada - comemora.

MACACOS LIGADOS A ELETRODOS

Foram duas experiências, com macacos e ratos, as publicadas ontem na "Nature". Na primeira, os cientistas conectaram os cérebros de macacos rhesus com eletrodos, que, dessa forma, trabalharam juntos para controlar os movimentos do braço de um avatar numa tela de computador. Cada animal controlou uma dimensão do movimento e, segundo Nicolelis, juntos eles otimizaram o resultado esperado.

Já a experiência com ratos é a extensão de um trabalho publicado na mesma revista, em 2013, e batizado pelo neurocientista de "computador orgânico". Os pesquisadores conectaram os cérebros de roedores para que eles realizassem tarefas computacionais, como reconhecimento de padrões e uma forma simplificada de previsão do tempo.

- Esta é mais uma linha de pesquisa pura. Estamos investigando o tipo de computação que se pode fazer com cérebros conectados - explica.

A teoria do neurocientista está no livro "O Cérebro Relativístico". Em linhas gerais, ele refuta a ideia de que os computadores digitais podem simular funções mais elaboradas que o cérebro humano, não impor ta quão sofisticados eles sejam. Com isso, Nicolelis trabalha no desenvolvimento de um computador formado pela ligação entre cérebro e máquina. Parece algo futurístico, mas...

- Não é ficção científica, tanto que isto está sendo demonstrado cientificamente - defende. - Teria aplicações diferentes das de um computador tradicional, não seria usado no processamento de texto, buscas na internet. Poderíamos trabalhar com reabilitação, mas ainda estamos estudando as possíveis aplicações. De qualquer forma, está se mostrando muito viável.

PESQUISAS GANHAM REPERCUSSãO

Esta linha de pesquisa é uma nova vertente do projeto Andar de Novo, que se popularizou mundialmente em 2014, quando um jovem paraplégico, usando um exoesqueleto, foi capaz de dar o chute inicial da Copa do Mundo, no Brasil. à época, o episódio foi permeado de polêmicas: tanto do lado de Nicolelis, que criticou a Fifa pelo pouco tempo e destaque dado à exibição, quanto de pesquisadores, que questionaram o alto valor (cerca de R$ 250 milhões) investido pelo governo federal para um experimento que, segundo os críticos, ainda não mostrou resultados na vida prática.

Nicolelis adianta que o projeto Andar de Novo terá desdobramentos em breve, já que uma revista científica aceitou a publicação de um novo estudo, o que deve ocorrer em um mês.

- Temos achados clínicos surpreendentes - afirma o neurocientista, que ainda não pode dar mais detalhes, devido ao contrato de confidencialidade com a revista.

O tom grandioso dos projetos de Nicolelis, aliado às publicações em revistas científicas de impacto, costuma ter destaque internacional. O artigo divulgado ontem ganhou a imprensa de diferentes países. O "New York Times" destacou, por exemplo, que a rede cerebral poderia permitir que policiais tomassem decisões coletivas em missões de busca e resgate ou que cirurgiões operassem, conjuntamente, um mesmo paciente.

- Em alguns momentos, mais cérebros pensam melhor do que um - afirmou ao jornal americano Karen Rommelfanger, diretora do Programa de Neuroética da Universidade de Emory, que não estava envolvida no estudo.

Ela já levantou a possibilidade de dilemas éticos sobre privacidade serem criados: quem seria culpado de um crime cometido por uma rede cerebral destas?

- é importante debater estas questões antes que surjam - diz.

Para Andrea Stocco, psicóloga da Universidade de Washington, o trabalho abre possibilidades que sempre foram sonhadas e levanta outras situações.

- Posso imaginar cirurgiões coordenando uma operação juntos, matemáticos visualizando a solução de um problema ou músicos e artistas numa nova maneira de trabalhar com criatividade - afirmou a pesquisadora, em entrevista à "Wired".

Na revista "New Scientist", Iyad Rahwan, do Instituto Masdar de Ciência e Tecnologia, de Dubai, diz ter ficado empolgado com os resultados.

- Isto mudará a maneira como humanos cooperam entre si - comentou o pesquisador.




O AVANçO NO COMBATE A UMA DOENçA EM TRANSFORMAçãO

09/07/2015 - O Globo


Acostumado a receber casos desesperadores em seu consultório, Carlos Gil vê com otimismo o novo tratamento do câncer. Pacientes que não tinham mais do que 2% de chance de chegar vivos ao ano seguinte hoje retomam a vida normal.

- Nos últimos cinco anos aconteceram avanços muito grandes. Ainda não é para todo mundo, pois nem todos os casos se adaptam à terapia-alvo. Mas já é um passo importante e só o início, pois há novas estratégias contra a doença. O problema é quem terá acesso a elas, pois são muito, muito caras - destaca ele.

O primeiro avanço foi o diagnóstico molecular. São conhecidos cerca de 140 genes com papel crucial no desenvolvimento do câncer, diz, numa análise sobre o genoma da doença publicada na "Science", Bert Vogelstein, diretor do Instituto Ludwig e pesquisador do Universidade Johns Hopkins. Há ainda outros 200 genes ligados ao câncer, e estes podem apresentar centenas de mutações, explica um dos pioneiros na pesquisa e na implantação do diagnóstico molecular no Brasil, Mariano Zalis, professor da UFRJ e biologista molecular da Progenética (uma das raras empresas no país especializada nesse tipo de exame).

- O diagnóstico molecular deveria ser feito em todos os casos porque indica não apenas se vale usar terapia-alvo para as mutações encontradas, mas ainda ajuda a administrar a quimioterapia convencional - salienta Zalis.

Há, porém, quatro grandes tipos de câncer para os quais os médicos dizem que o diagnóstico molecular deveria ser obrigatório: mama, pulmão, melanoma e colorretal. Para todos esses há terapias-alvo e características genéticas bem conhecidas. Carlos Gil não esquece o caso da jovem de 27 anos que chegou grávida ao seu consultório com metástase nos ossos de um câncer de pulmão avançado. Para ela, a terapia chegou tarde. Quando se fez o diagnóstico molecular e se descobriu que ela tinha uma mutação chamada eml4-alk, o câncer já havia chegado ao cérebro. A moça teve o bebê, que nasceu com sequelas devido à quimioterapia convencional. A criança acabou por morrer com 1 ano de idade; a mãe, logo depois, em 2014.

- Esse caso é emblemático. Uma jovem mãe, no auge da carreira e que nunca havia fumado. Ela representa um novo tipo de paciente. O câncer do pulmão tem aparecido em pessoas mais jovens e não fumantes e não sabemos o motivo. Não existem dados epidemiológicos. Mas há 15 anos quase não via câncer de pulmão em pessoas com menos de 60 anos. Não sabemos por que mudou, mas para essas pessoas o acesso ao diagnóstico molecular é fundamental. A diferença entre a vida e a morte, numa doença que avança depressa - observa Gil.

CURA NãO é GARANTIDA, MAS VIDA MELHORA

As terapias-alvo não são garantia de cura. São indicadas para os casos em que o tumor apresenta mutações que a ciência aprendeu a controlar. Bloqueiam vias de proliferação do tumor e, por isso, são específicas, com poucos efeitos colaterais. Se não curam, podem manter o tumor sob controle.

- A terapia-alvo estabeleceu um novo paradigma. Ela cronifica o câncer. E oferece uma qualidade de vida impossível antes. Digo aos meus pacientes: "Você não está doente. Você tem uma doença". Quando o tumor que ele tem adquire resistência a um desses remédios, buscamos outro. No caso do câncer do pulmão, a mudança foi radical. é uma outra doença, muito mais tratável - diz o oncologista. Segundo ele, o momento agora é do melanoma. - Pacientes que receberiam o diagnóstico como uma sentença de morte hoje podem esperar viver muitos anos, e viver bem. Isso é uma mudança imensa - conta.

Existem cerca de 20 dessas drogas no mercado internacional, a maioria delas capaz de atacar mais de uma mutação associada ao câncer. Junto com Cuba, o Brasil é um dos países com menor taxa de aprovação desses medicamentos, todos caríssimos, no mercado. Aqui há dez liberados. Mais liberação facilitaria o acesso pelo SUS a um número muito maior de pacientes.

- Minha maior felicidade é poder oferecer opções que não existiam quando me formei - diz Gil.

Os próximos passos são a imunoterapia e a terapia celular. Ambas ainda experimentais. Ambas parte da chamada medicina de precisão, personalizada e, até o momento, muito cara. A imunoterapia emprega o próprio sistema de defesa do organismo para atacar células cancerígenas. Já a terapia celular é muito mais complexa. Nela, a célula do tumor é reprogramada para se comportar de forma normal. Uma criança com leucemia em último estágio ficou livre da doença ao receber uma terapia celular na Universidade de Pittsburgh. Mas, por enquanto, é um caso isolado.




A REVOLUçãO DO DNA QUE SALVA VIDAS DO CâNCER

09/07/2015 - O Globo


Pacientes sobrevivem graças a novas terapias baseadas no genoma, ainda muito caras.

A rotina é para a vida inteira. Todos os dias, a designer Melissa Vianna toma um comprimido pela manhã. Fora a necessidade de manter o hábito com rigor, o dia dela nada tem de excepcional. Se divide entre família, o trabalho num escritório na Zona Oeste do Rio e lazer. Excepcional é o medicamento. Melissa depende de um único comprimido diário para viver.

O comprimido de aparência corriqueira faz parte de uma classe de remédios que transformou o tratamento do câncer. Salva gente para quem a medicina convencional nada oferece. Quinze anos após o anúncio do sequenciamento do genoma humano, drogas assim, as chamadas terapias-alvo, começam a tornar realidade promessas deste que é considerado um dos maiores feitos científicos da Humanidade.

As promessas continuam a superar por larga margem os resultados concretos. Mas estes representam vida - e com qualidade - para um grupo crescente de pacientes, como Melissa. Ela não perde o sorriso nem a esperança de que a medicina avance e lhe dê mais do que uma droga que de tão nova ainda é incerta. E ofereça também preços mais acessíveis do que os R$ 32.780 que o tratamento com terapia-alvo custa por mês, pagos pelo plano de saúde após uma ação na Justiça.

- Hoje, você precisa ter um excelente médico e um advogado tão bom quanto; sem este último, pagar o tratamento é inviável - afirma Melissa.

O câncer é, desde o princípio, um dos alvos principais da pesquisa do genoma. O nome que ainda inspira medo e traz estigma engloba mais de cem tipos de doenças. De fato, cada pessoa com câncer tem uma doença tão única quanto o seu DNA. é o conhecimento dessas particularidades que tem produzido avanços.

Hoje, o câncer é a segunda maior causa de morte não violenta no Brasil e em boa parte do mundo, atrás apenas das doenças cardíacas. Os números continuam a crescer não somente devido ao envelhecimento da população, mas ao surgimento de casos em pessoas mais jovens com causas tão variadas quanto misteriosas, indo do tabagismo a mutações e fatores ambientais ainda não bem conhecidos.

Melissa, de 53 anos, é um desses casos cuja causa permanece misteriosa. Um dia, há pouco mais de dois anos, começou a sentir falta de ar e uma sensação de peso sobre o coração ao se deitar do lado esquerdo. Pensou que fosse refluxo porque já havia sofrido disso antes. Tratou. Não melhorou. O médico pensou que os pulmões estavam bem, pois nos exames clínicos não havia sinais de complicação. Pediu uma radiografia. Quando esta ficou pronta, quase não se viam os pulmões, ocultos por uma mancha branca.

- Isso foi em 22 de maio de 2013. O dia em que minha vida mudou para sempre. A expressão do técnico do raio X era a pior possível. Ele parecia tão surpreso quanto eu. Nunca fumei. Sempre fui saudável. Fazia checkups regulares. O que eu tinha? - lembra.

De início, o médico, um clínico, cogitou uma tuberculose. Um amigo pneumologista entrou no caso. Pediu uma tomografia. O resultado, uma massa no mediastino. A desconfiança: câncer de pulmão. Fez-se uma biópsia. O resultado: um adenocarcinoma de pulmão, inoperável por estar atrás do coração.

- Um dos piores momentos foi ouvir o médico que fez a biópsia dizer com frieza que o prognóstico era o pior possível. Achei que minha vida tinha acabado. Não sabia o que dizer aos meus filhos, marido e amigos que esperavam do lado de fora - lembra ela.

Melissa teve apoio. O mais velho dos dois filhos, de 30 anos, foi morar com ela. O marido esteve o tempo todo presente e os amigos não faltaram. Mas o prognóstico não mudava. Ela também encontrou frieza na médica do Hospital Universitário Clementino Fraga, da UFRJ, que lhe disse só restar uma quimioterapia agressiva - leia-se uma vida de mal-estar permanente, desfiguração (os cabelos caem e o corpo incha com cortisona) e perda de forças, dentre numerosos outros efeitos colaterais.

- "Tenho um paciente que sobreviveu assim seis anos", me disse a médica, como se fosse muito. Desci aos prantos os 14 andares de escada. Não era a vida dela. A minha parou. Tinha sido congelada - conta.

Ela procurou um outro oncologista, mais humano, que também lhe recomendou sessões de quimioterapia. Foi-se a saúde, ficou o tumor. Desesperada, chegou a visitar uma freira famosa por supostas curas que lhe disse para não tomar mais remédios.

- Graças a Deus e ao Drauzio Varella não segui seu conselho. Estaria morta - frisa.

Chegou então a Carlos Gil, oncologista clínico coordenador do grupo NEOTórax da Oncologia D’Or e Pesquisador do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino. Este insistiu no diagnóstico molecular. O outro médico dizia que era "bobagem" e que "não levaria a nada". Mas Gil queria saber a "identidade" do tumor, os genes mutados ligados à doença. Se ela fosse descoberta, poderia haver uma terapia- alvo. Melissa fez dois exames no Brasil e um nos EUA, e o resultado foi inconclusivo. O médico não desistiu e mandou uma amostra do tumor para o Japão.

Para isso, foi preciso fazer uma nova cirurgia, para coletar, mais uma vez, um pequeno pedaço do tumor. Mas então ele revelou sua essência. Tinha uma mutação chamada Ros1. Esse tipo de mutação responde por menos de 2% dos casos de adenocarcinoma. Mas para ela há uma droga específica, a crizotinib.

- Fiquei muito feliz. Tinha esperança. Mas fui orientada a buscar imediatamente um advogado para conseguir autorização da Anvisa (o medicamento não era liberado aqui) e o pagamento pelo plano. E ainda é preciso contratar uma importadora de São Paulo, a única que pode trazer. é mais um sofrimento - destaca.

A TRANQUILIDADE DE VOLTA

O medicamento que salva Melissa chega por Sedex, entregue todos os meses em sua casa. Com ele, o direito de uma vida normal. Em dois meses de tratamento, iniciado em novembro de 2014, o tumor havia desaparecido no exame de imagem. Junto com ele e o fim da quimioterapia, todos os sintomas. De volta, os cabelos, o bem-estar e a vida normal.

- Recuperei minha vida. Quero voltar a praticar atividade física. Posso aproveitar os momentos preciosos com meu marido, meus filhos, minha família e amigos. Deixei um dos meus trabalhos. Passei a valorizar mais cada dia, a ter mais compaixão. Estou mais próxima de Deus e da natureza. O câncer nos transforma para sempre - diz.

Melissa sabe que a droga é nova e que nunca foi usada por muito tempo para que se conheça sua ação de longo prazo.

- Minha preocupação agora é ter a garantia de que o plano vai pagar. De que terei essa chance. Não tenho data para parar. Se parar, o tumor volta - frisa ela, que contou sua história para que outras pessoas com câncer tenham mais acesso à informação sobre novos tratamentos. - Eu não sabia nada. Quero ajudar outras pessoas a não passarem por isso.




Saúde como fator competitivo na agenda empresarial

09/07/2015 - Valor Econômico

Os custos com a saúde dos trabalhadores preocupam crescentemente as empresas brasileiras. O valor dos planos de saúde já representa 11% da folha de pagamento (o segundo maior custo, após a própria folha) e a inflação do setor, que tem sido crescente, poderá chegar a 18% neste ano. Os gastos das empresas brasileiras com a saúde dos trabalhadores somaram US$ 23,7 bilhões entre 2010 e 2014, de acordo com dados do Departamento Nacional do Sesi.

Os números são expressivos, mas não dizem tudo. Poucos sabem que esses dispêndios mais visíveis representam apenas 30% dos custos totais de uma empresa com a saúde - ou com a falta de saúde - de seus trabalhadores. Os 70% restantes têm origem na baixa produtividade (fenômeno conhecido por "presenteísmo") e nas faltas ao trabalho (absenteísmo), causadas na maioria das vezes por doenças crônicas como obesidade, hipertensão, diabetes e doenças músculo-esqueléticas, além de patologias mentais e emocionais, como depressão, ansiedade e stress. é o que demonstram estudos internacionais compilados pela consultora americana HealthNext.

A correlação entre doenças e custos é duplamente evidente. Trabalhadores doentes produzem menos do que os saudáveis e o seu tratamento custa cada vez mais caro. Porém, a relação inversa também é válida. De acordo com a HealthNext, para cada mil dólares que as empresas deixam de gastar com médicos e remédios em razão da melhoria da saúde de seus trabalhadores, a produção aumenta em dois mil dólares. A boa saúde é, portanto, um impressionante meio para o aumento da competitividade.

A partir dessas constatações cresce em todo o mundo o interesse pelo investimento na melhoria dos ambientes de trabalho. Nesse novo contexto, o foco não é mais o tratamento do trabalhador doente, mas o investimento no trabalhador saudável. O objetivo é ajudá-lo a manter-se com saúde por muito mais tempo e, portanto, mais feliz, produtivo e comprometido com os objetivos da empresa. Estudos demonstram que o maior comprometimento é também uma característica de trabalhadores que desfrutam de boa condição de bem-estar.

Não só as empresas ganham. Trabalhadores que mudam hábitos alimentares, praticam exercícios e deixam de fumar elevam substancialmente a sua própria qualidade de vida. Assim, garantir o envelhecimento saudável da população é essencial ao futuro dos países. O aumento da longevidade é uma excelente notícia, mas implica mais gente aposentada sendo sustentada, ao longo de um maior número de anos, por menos gente em atividade, o que empurra o sistema previdenciário para a falência.

Segundo Robert J. Shapiro, principal conselheiro econômico de Bill Clinton e autor do livro "A previsão do futuro" (2010), "todas as crises de assistência médica que a maioria dos países enfrenta envolvem as combinações de número de pessoas idosas em rápido crescimento e os custos das tecnologias médicas usadas para tratá-las igualmente crescendo com rapidez". A solução lógica será estender o tempo de trabalho e investir no combate às doenças crônicas que incapacitam os mais idosos.

Apesar de todas as evidências que comprovam os benefícios de ambientes de trabalho saudáveis, ainda é pequena a disseminação dessa cultura entre as empresas brasileiras. Não é fácil incorporar essa agenda, pois trata-se de uma inversão cultural cuja promoção depende do setor produtivo. A visão tradicional considera o trabalho uma fonte de doenças em função do esforço físico e do stress a que são submetidos os trabalhadores. Mas muitas empresas já estão provando que o trabalho pode ser exatamente o oposto: um vetor para a promoção do bem-estar. São empresas que posicionaram a saúde como componente estratégico da gestão e que contam com o engajamento de suas lideranças em todos os níveis.

Por meio da boa gestão das informações da saúde dos trabalhadores, essas empresas conseguem identificar os grupos expostos a riscos e, assim, direcionar ações com grande efetividade. Com programas bem elaborados de prevenção de doenças e de promoção do bem-estar as empresas conseguem a adesão do seu pessoal e obtêm excelentes resultados. Em algumas empresas, a soma das reduções de circunferência abdominal dos trabalhadores mede-se em dezenas de metros, e a perda de peso em toneladas. A boa alimentação e a prática de exercícios reduzem o risco cardíaco e o desenvolvimento de doenças crônicas, com consequências na queda do absenteísmo e no aumento da produtividade. O ataque aos fatores causadores de stress e ansiedade obtém resultados semelhantes.

Além de melhorar o desempenho do trabalho, as ações levam à redução de custos com assistência médica e encargos previdenciários. O Fator Acidentário Previdenciário (FAP), por exemplo, é calculado com base na quantidade de licenças médicas e aposentadorias causadas por motivo de saúde. A alta frequência dessas ocorrências pode dobrar o valor a ser pago por uma empresa em seguros de acidentes de trabalho. Há situações em que o seguro pode equivaler a 6% da folha de pagamento.

Casos reais e estudos apresentados no 3º Global Healthy Workplace Awards & Summit, um dos mais importantes eventos mundiais sobre bem-estar no trabalho, recentemente realizado em Florianópolis (SC), com a presença de especialistas de mais de 40 países, quantificam os resultados obtidos em programas eficientes de bem-estar. Para cada dólar investido obtém-se uma média de seis dólares de retorno. Isso sem contar que uma eficiente política de bem-estar organizacional é uma excelente forma de atrair e reter talentos. Eis uma agenda que, em função de seu alcance social e econômico, não pode mais ser ignorada pelas empresas brasileiras.




A DOENçA REGRIDE, MAS A LUTA CONTINUA

09/07/2015 - O Globo


A arquiteta gaúcha Flavia Maoli se divertia com o cabelo que insistia em cair sobre seu rosto na sessão de fotos para esta reportagem. Por cinco de seus 28 anos, Flavia aprendeu como contornar a perda do cabelo. E há dois anos tem dedicado boa parte de seu tempo a ajudar mulheres com câncer a recuperarem a autoestima, o que inclui aprender a usar lenços e perucas para disfarçar um dos maiores danos psicológicos da doença, a calvície provocada pela quimioterapia. Flavia, como Melissa Vianna, também foi beneficiada por uma droga da classe das terapias-alvo. O tratamento iniciado no início de 2014 lhe devolveu bem mais do que os cabelos. Trouxe de volta a saúde e a chance de levar uma vida normal, num momento em que a doença já não respondia a mais nenhum tratamento.

O caso dela é ainda mais peculiar porque o tipo de câncer que contraiu, um linfoma de Hodgkin, não costuma ser tratado dessa forma. Mas foi a solução encontrada pela médica Laura Fogliatto, do Instituto do Câncer de Porto Alegre. Flavia apresentou os primeiros sintomas da doença em 2010, quando cursava arquitetura.

- Descobri porque comecei a me sentir mal sem motivo aparente. Em dezembro de 2010, se bebesse um golezinho de cerveja passava muito mal, tinha taquicardia, ansiedade, suava. Mesmo assim, achei que era alérgica a álcool e ignorei. Só procurei um médico depois que surgiu uma bolinha acima da clavícula, que começou a crescer - conta ela.

O diagnóstico foi linfoma de Hodgkin, uma doença que costuma ter um bom prognóstico. Flavia fez a quimioterapia tradicional em 2011. Sofreu com o tratamento, mas pensou que havia ficado bem. E ficou mesmo, por um tempo. Em 2013 o linfoma voltou e ela precisou fazer um transplante autólogo de medula (células de si mesma "limpas" da doença). Formou-se em 6 de setembro e se internou no dia 24. O transplante, porém, não funcionou e o linfoma continuou a avançar. Flavia havia feito diagnóstico molecular em 2011, mas naquele ano ainda não existia uma droga para seu caso. Em 2014 a situação era outra, e Laura Fogliatto viu que o remédio brentuximab mostrava bons resultados para pessoas com a mutação apresentada por Flavia, chamada CD30. O problema é que a droga era experimental na ocasião - agora já foi liberada -, o que só aumentava a via crúcis para obtê-la.

- Precisei de uma ótima advogada. Ela e minha médica tiveram que cumprir uma imensa burocracia de relatórios e trâmites legais, que duraram 50 dias. No meu caso, foi possível esperar. E no fim o SUS pagou o tratamento - salienta Flavia.

Ela tomou seis aplicações com duas ampolas. Cada uma das ampolas custou R$ 14,5 mil. Uma conta de R$ 174 mil.

- é muito caro, eu sei. Mas quanto vale a minha vida? A doença desapareceu. Não sofri efeitos colaterais e hoje retomei minhas atividades. Sou muito grata às pessoas que me apoiaram e tento retribuir ajudando aquelas que enfrentam o que passei. Muita gente nem sabe que tem direito a lutar por esses remédios. Muitos se entregam ao desespero, têm medo de se expor. Pessoas com câncer não precisam de pena, precisam de respeito. Você não pode deixar o câncer tomar conta da sua vida. Tem que estar no controle - afirma ela.

‘NINGUéM ESTá LIVRE DE NADA’

Ainda em 2013, Flavia criou o blog Além do Cabelo ( alemdocabelo. com). Agora, com dois amigos, leva o Projeto Camaleão por todo o Brasil. Nele, dá orientações de como as pessoas devem se cuidar durante o tratamento.

- Aprendi que ninguém está livre de nada. Não quero voltar à vidinha pré-câncer, quando uma resposta mal dada por um amigo, tudo podia ser motivo para aborrecimento. Valorizo cada pequena alegria - diz.

O historiador Manoel Valim nunca encontrou Flavia. Mas pensa igual. Em comum, a insatisfação com a pouca atenção que o combate ao câncer recebe no Brasil e a necessidade de motivar pessoas que adoeceram a jamais se entregarem. Valim, de 77 anos, não passa um dia sem andar seis quilômetros pelo bairro de Laranjeiras, onde mora. O sorriso é permanente. Não esconde a felicidade de o último exame, feito há poucas semanas, ter indicado o desaparecimento do tumor no pulmão. O mesmo para qual o prognóstico inicial era de no máximo 2% de chance. Paciente de Carlos Gil, ele fez diagnóstico molecular, mas seu caso não se encaixava em terapia-alvo.

- Fumei por 40 anos e tinha parado há 20 anos. Então pensei que tinha driblado o câncer. Estava errado. Mas não me entreguei. Fiz tudo o que tinha que fazer e fui com otimismo. Isso ajudou - diz Valim.

Valim era jovem durante o golpe de 64 e viu o regime militar prender e perseguir a maioria de seus amigos. Ele mesmo foi perseguido:

- Não me pegaram e decidi que o câncer também não iria. Lutei com a mesma determinação. Nunca podemos nos entregar. A doença não pode ocupar o centro de sua vida.

Carlos Gil diz que o caso de Valim chama a atenção porque, além de sua ótima recuperação, destaca a importância da determinação do paciente. E também da tecnologia.

- Ele fez quimio convencional porque para o câncer associado ao fumo são raros os casos de pacientes candidatos à terapia-alvo. Porém, os novos exames são fundamentais para controlar a doença. Seus resultados são excepcionais e há cinco anos seriam impossíveis. Acima de tudo, Valim é um lutador - elogia o médico.




Apesar do frio, dengue não dá trégua em SP

09/07/2015 - O Estado de S.Paulo


Embora tenham diminuído, os casos de dengue continuam aparecendo no Estado de São Paulo, mesmo com a chegada do período mais frio do ano.

Segundo o Ministério da Saúde, de 6 a 13 de junho foram registrados 22,8 mil novos casos no Estado, além de terem sido confirmadas mais 23 mortes.

Para o pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Edson Duarte Moreira Junior, a chegada do frio, que em outros anos representou uma barreira para a dengue, não mudou o quadro neste ano.




O médico que mentiu e levou à quimioterapia centenas que não tinham câncer

09/07/2015 - Folha de S.Paulo / Site


Quimioterapia pode salvar vidas, mas pode gerar danos graves se aplicada a pessoas saudáveis

Nesta semana, dezenas de pessoas compareceram a um tribunal em Detroit, nos Estados Unidos, para testemunhar contra o médico Farid Fata, chamado por alguns de "Doutor Morte".

Elas chegaram ao local fragilizadas, apoiadas por bengalas, alguns com suas articulações enfaixadas e quase todas exaustas pelo desgaste físico e psicológico causado por anos de quimioterapia.

Ali, revelaram um fato aterrorizante: seu oncologista havia mentido para elas, que nunca haviam tido câncer.

Ao menos 553 pessoas se submeteram a este duplo sofrimento (dos efeitos colaterais do tratamento e o fato de acharem que tinham uma das doenças mais fatais do mundo) sem padecer deste mal, segundo a queixa criminal aberta pela polícia federal americana, o FBI, contra Fata.

Durante os testemunhos das vítimas, realizados nesta semana, Fata ficou sentado a três metros delas. Imóvel, escutava enquanto elas contavam sobre o que passaram.

'Você é um monstro'

Pacientes tiveram sequelas depois de serem submetidos a tratamento desnecessário

"Mesmo que não esteja morta, sou uma sombra do que era", disse Maggie Dorsey, uma das pacientes. "Há dias em que não consigo nem ficar de pé."

Monica Flagg disse à emissora CBS estar furiosa: "Não posso crer que um médico tenha traído tanta gente desta forma".

O FBI afirma que Fata não apenas diagnosticou e tratou casos falsos de câncer como também prescrevia tratamentos caros e agressivos a pacientes que estavam em fase terminal e não teriam chances de sobreviver.

"Eu te odeio, Farid Fata", disse Laura Stedfeld ao médico em tom de voz elevado. "Você é repugnante. Você é um monstro. Evidentemente, é um covarde já que não consegue nem me olhar. Você me envenenou, me torturou e matou meu pai."

Alguns especialistas que testemunharam diante do juiz Paul D. Borman, na cidade de Detroit, disseram que o médico administrou uma substância chamada rituximab.

Farid Fata enviou faturas de mais de US$ 225 milhões para o sistema de saúde americano

Ela deve ser aplicada no máximo oito vezes em linfomas agressivos, mas Fata chegou a aplicá-la 94 vezes em um paciente.

As motivações do médico eram claramente econômicas, segundo a denúncia da acusação. Entre 2007 e 2013, Fata apresentou faturas num total de US$ 225 milhões (R$ 725 milhões) ao Medicare, o sistema de seguro de saúde estatal dos Estados Unidos.

Esta fraude era feita por meio da sociedade Michigan Hematology Oncology, que dispunha de sete clínicas no Estado de Michigan.

Danos a pessoas saudáveis

Cartaz de testemunha traz foto do médico e de suas vítimas

A quimioterapia é um tratamento que permite destruir as células cancerosas que provocam metástase ou que tenham se espalhado pelo corpo. é administrada em ciclos que variam entre dias e meses.

Mas, como se trata de uma medicação agressiva, ela não afeta apenas as células doentes, mas também aquelas saudáveis. Por isso, pode causar problemas de saúde e deixar doentes pessoas que não tenham câncer, como foi o caso das vítimas de Fata.

Estes efeitos colaterais afetam de forma distinta a cada pessoa, de acordo com sua sensibilidade e estado de saúde.

Segundo a Sociedade Americana Contra o Câncer, as células sãs com probabilidades de serem prejudicadas pela quimioterapia são aquelas que produzem sangue na medula óssea, assim como as da boca, do trato digestivo, do sistema reprodutor e capilares.

Alguns medicamentos quimioterápicos podem gerar danos a células do coração, rins, bexiga, pulmões e sistema nervoso.

Outros tipos de quimioterapia causam efeitos colaterais a longo prazo, como infecções no coração ou danos aos nervos, assim como problemas de fertilidade.

A organização americana esclarece que a maioria dos efeitos desaparece lentamente após o fim do tratamento, mas adverte que "em certos, casos eles podem durar por toda a vida".

No julgamento, Fata declarou-se culpado de 16 acusações, entre elas conspiração, fraude e lavagem de dinheiro - e agora está sendo forçado a ouvir os testemunhos das pessoas cujas vidas arruinou antes de o juiz decretar sua sentença.

A promotoria demanda uma pena de prisão de 175 anos para o médico, enquanto seus advogados pedem que este tempo seja reduzido para 25 anos.




Sobreviventes da Aids

09/07/2015 - Folha de S.Paulo


Quando foi diagnosticada com Aids, aos 67 anos, a pianista Olivethi Oliva Cahli só pensava numa providência: comprar um esmalte vermelho e sair marcando pratos, talheres, xícaras e copos do seu uso pessoal.

Sem saber das formas de transmissão do vírus HIV (relações sexuais e transfusão de sangue), a viúva, mãe de dois filhos e avó de três netos temia contaminar a família.

Dias antes, sentindo fraqueza e falta de ar, ela havia sido internada com pneumonia. No hospital, após uma bateria de exames, o médico deu a notícia de supetão. "A senhora tem Aids."

"Parece que o prédio caiu na minha cabeça. Naquela época, ninguém falava que uma mulher casada, na minha idade, podia ter Aids. Fiquei apavorada", conta.

A população com mais de 60 anos é uma das faixas etárias em que a ocorrência de casos de Aids mais cresceu na última década--32% entre 2014 e 2013--, só perdendo para o aumento de 53% entre os jovens, entre 15 e 19 anos.

Hoje, aos 88 anos, Olivethi dá risada quando lembra do dia em que recebeu o diagnóstico. "Meu filho ficou furioso, queria matar o médico. Dizia: 'Onde já se viu o senhor falar para uma senhora de idade que ela que tem Aids?'".

A pianista, intérprete de Chopin (1810-1849), não sabe como se infectou, mas suspeita que tenha sido por meio do marido. "Só tive relações com um homem na minha vida, o meu marido, e nunca fiz transfusão de sangue."

O marido morreu em 1993, um ano antes do diagnóstico de mulher. Diabético, caiu no banheiro e foi para a UTI, onde sofreu falência dos órgãos. A família não sabe se ele fez teste para HIV na internação.

Olivethi diz que não pensa no assunto. "Se ele me traiu e me contaminou, já o perdoei. Quem nunca errou?"

Há muitos anos sem sinais do vírus HIV no sangue, ela conta que até esquece "do bicho". "Eu nunca aceitei a doença. Coloquei na cabeça que ela não me pertence." Toma religiosamente o coquetel, combinação de comprimidos que controlam a disseminação do HIV. "Antes dele, o remédio [AZT] fazia muito mal, me sentia fraca, enjoada. Hoje não sinto nada."

A pianista adora praia e está sempre viajando para visitar os filhos que moram no Rio de Janeiro e em São Paulo. "Tenho tanta energia que minhas amigas já brincaram dizendo que vão tomar o coquetel também para dar conta de me acompanhar."

OUTRAS HISTóRIAS

A história de Olivethi é uma das cinco que estão no livro "Histórias da Aids" (editora Gutenberg, R$ 34), que o médico Artur Timerman e a jornalista Naiara Magalhães lançam no próximo dia 21.

São pacientes "pós-coquetel", homens e mulheres com HIV que levam uma vida praticamente normal, situação muito diferente da vivida pelos doentes no início da epidemia, na década de 1980.

Os relatos vêm entrelaçados com a história da evolução da Aids.

"Era gente jovem escapando entre os dedos que nem água, morrendo por um problema que ninguém sabia tratar", relembra o infectologista Timerman, que trabalhava no Hospital das Clínicas quando a epidemia eclodiu.

à época, o temor dos pacientes não era nem a morte quase certa, mas o que constaria no atestado de óbito.

"Havia muito estigma. Companhias se recusavam a pagar seguro de vida às famílias se a causa da morte do segurado fosse a síndrome."

Em 1996, 15 anos após o anúncio dos primeiros casos de Aids, começou a ser usado o coquetel, o que tornaria a Aids uma doença possível de tratar --embora muitas mortes ainda ocorram por conta do diagnóstico tardio ou da falta dele.

Do ponto de vista científico, o que se busca agora é a cura, assunto que encerra o livro. Segundo Timerman, os pesquisadores contam com a ajuda de pessoas naturalmente resistentes à doença.

Por características genéticas, 2% da população mundial não se contaminam pelo vírus mesmo quando expostos. Outros 5% adquirem o vírus, mas não ficam doentes, pois o organismo é capaz de controlar o HIV espontaneamente, sem remédios.

Uma das frentes de pesquisa mais avançadas nessa área envolve o uso de engenharia genética. "A marcha da cura é irreversível. E a esperança nunca esteve tão viva", diz.

HISTóRIAS DA AIDS

Lançamento Dia 21/7, das 18h30 às 21h30, na livraria da Vila (alameda Lorena, 1.731, São Paulo)

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