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Pílulado dia seguinte do HIV
09/11/2014 - O Estado de S.Paulo
Colunista: Jairo Bouer

Já imaginou tomar um remédio antes e depois do sexo para prevenir a aids? Um estudo que vem sendo realizado desde 2012 na França e no Canadá - Ipergay -, com 400 homens que fazem sexo com homens, testa um esquema mais simples e prático de prevenção de infecção por HIV. Bom lembrar que o método anterior, a profilaxia pré-exposição (PrEP), já usado em diversos países, exige a ingestão diária e contínua de comprimido.
Segundo artigo da Agência de Notícias da Aids, publicado na semana passada, o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) comemorou os resultados promissores do trabalho. No novo esquema proposto, a pessoa toma dois comprimidos algumas horas antes do sexo e mais um comprimido nos dois dias seguintes.
A PrEP é considerada um recurso adicional de prevenção ao HIV, indicada para pessoas com alto risco de se contaminar, como homens que fazem sexo com múltiplos parceiros e não se protegem de forma consistente - o uso regular de camisinha.
De forma análoga ao que acontece com a pílula anticoncepcional, a PrEP consiste em usar um único comprimido ao dia. A combinação de duas drogas antivirais (emtricitabina e tenofovir), segundo uma série de estudos, reduz de forma dramática a chance de infecção pelo HIV. Mas o método, para alcançar sua máxima eficiência, exige que a pessoa não se esqueça de tomar o remédio, o que pode ser um problema para muita gente.
Já a nova proposta de esquema de prevenção se assemelha mais à da pílula do dia seguinte, com um uso mais pontual da medicação. Para quem tem uma vida sexual muito frequente e diversa, é provável que seja mais fácil seguir o esquema contínuo. Os dados estatísticos que comparam a eficácia da nova posologia com a da PrEP tradicional vão estar disponíveis a partir do próximo ano.
viabilidade de se usar o método do uso diário de antivirais no País. Voluntários estão sendo recrutados no Rio e em São Paulo. Enquanto isso, o Ministério da Saúde avalia a possibilidade de dispor dessa modalidade de prevenção na rede pública.
Outras DSTs. Mas não é só a aids que preocupa quando se fala nos riscos do sexo sem proteção na população gay. Um novo estudo realizado pela Fiocruz, publicado na Folha de S.Paulo na semana passada, que acompanhou 600 homossexuais em Campinas, no interior, revelou que 7,6% deles são portadores de HIV, 11% foram contaminados pelo vírus da hepatite B e 10% pela sífilis. Para qualquer das doenças, essa é uma proporção pelo menos dez vezes maior do que a encontrada na população geral.
Outro dado importante mostra que 30% dos homens testados tiveram uma coinfecção - estavam contaminados por mais de um agente infeccioso ao mesmo tempo. Pesquisas mostram, por exemplo, que a sífilis aumenta muito o risco de contaminação por HIV. Mais: os anticorpos contra os dois tipos de HPV mais ligados ao câncer (16 e 18) tiveram prevalências altas, de 31,9% e de 20,3%, respectivamente, na população pesquisada.
Outro estudo feito há cerca de dois anos no centro de São Paulo, pela Santa Casa e pela Secretaria Estadual da Saúde, já mostrava uma prevalência elevada de HIV na população de homens que fazem sexo com homens, cerca de 20 vezes maior do que na população geral.
Se, de um lado, as novas tecnologias como a PrEP podem diminuir muito a chance de contaminação por aids, é importante reforçar outras formas de abordagem para prevenir as demais DSTs. Um dos receios é que novas tecnologias possam diminuir ainda mais a aderência ao preservativo.
Existem vacinas disponíveis para prevenir infecção por vírus da hepatite B e do HPV e a boa e velha camisinha continua a ter papel central na barreira contra as demais doenças transmitidas pelo sexo. Campanhas e ações preventivas específicas para a população gay também podem ter papel importante para mudar o rumo dessa história.
Correção. No texto da semana passada a frase final correta é: Mesmo em homens com história familiar de câncer de próstata e população negra (grupos de maior risco), o teste de PSA não apresentou benefícios.
*Jairo Bouer é psiquiatra

Custos afetam investimentos de farmacêuticas em 2015
10/11/2014 - O Estado de S.Paulo


As indústrias farmacêuticas registraram um aumento de 13% a 18% nos seus custos, enquanto os reajustes nos preços ficaram entre 3% e 5%, segundo Nelson Mussolini, diretor executivo do Sindusfarma (Sindicato de Produtos da Indústria Farmacêutica do Estado de São Paulo). “Os custos podem ser ainda maiores dependendo do volume importado pela companhia (boa parte dos insumos para produção de medicamentos vem do exterior)”, disse. Com o dólar valorizado, o Brasil agora está barato, o que poderia atrair investimentos estrangeiros.
Osetor foi alvo de consolidação entre 2009 e 2012. No entanto, os investidores ainda estão com receio do cenário para 2015. Apesar da perspectiva, as indústrias instaladas no País deverão crescer 12% este ano, segundo o Sindusfarma.

Pesquisa e desenvolvimento

 

Cães ajudam a testar droga antienvelhecimento
10/11/2014 - O Globo

Cães podem se tornar aliados dos humanos no combate a doenças do envelhecimento, como cânceres e cardiopatias. É o que creem os cientistas Matt Kaeberlein e Daniel Promislow, da Universidade de Washington, que administrarão rapamicina, medicamento antirrejeição para transplantados, na comida dos animais. Eles alegam que o resultado encontrado pode ser aplicado em humanos. Testada em ratos, a droga prolongou a vida em mais de 10%.


Hormônio em leite da mãe manda 'mensagem'
10/11/2014 - Folha de S.Paulo


Quanto mais os cientistas examinam o leite materno, mais descobrem quão complexo ele é.

Um novo estudo feito com macacos, publicado no periódico "Behavioral Ecology", aponta que um hormônio presente no leite, o cortisol, funciona como um "aviso" quanto à quantidade de energia que o leite poderá oferecer.

Katie Hinde, bióloga comportamental de Harvard e principal autora da nova pesquisa, e seus colegas analisaram 108 macacas rhesus que amamentavam sua prole.

Os pesquisadores coletaram amostras do leite para medir quanta energia ele fornecia e a quantidade de cortisol que continha.

O nível de cortisol no leite variava entre as macacas segundo o número de filhotes que elas já tinham tido. Mães de primeira viagem produziam leite com mais cortisol.

Segundo Hinde, quando as macacas começam a ter filhotes, elas não conseguem armazenar muita energia no leite. Suas glândulas mamárias ainda estão subdesenvolvidas e não conseguem fabricar o leite de forma eficiente.

A autora sugere que o alto nível de cortisol manda a mensagem de que os bebês não devem esperar muito leite ou energia. Filhotes alimentados com leite rico em cortisol desenvolvem um temperamento nervoso, concentrando sua energia limitada em ganhar peso. Como resultado, crescem mais rapidamente, apesar da pouca energia que receberam de suas mães inexperientes.

O cortisol no leite materno também pode influenciar o desenvolvimento de humanos. Um estudo de 2013 mostrou que bebês que consumiam leite materno com níveis altos de cortisol tendem a ser mais medrosos.

Decifrar os sinais que os bebês detectam no leite materno pode ajudar um dia a mudar as fórmulas infantis. Por enquanto, fabricantes tentam apenas replicar os nutrientes e até os micróbios do leite materno.

 

 


Saúde


Cães ajudam a testar droga antienvelhecimento
10/11/2014 - O Globo

Cães podem se tornar aliados dos humanos no combate a doenças do envelhecimento, como cânceres e cardiopatias. É o que creem os cientistas Matt Kaeberlein e Daniel Promislow, da Universidade de Washington, que administrarão rapamicina, medicamento antirrejeição para transplantados, na comida dos animais. Eles alegam que o resultado encontrado pode ser aplicado em humanos. Testada em ratos, a droga prolongou a vida em mais de 10%.
 


A falta de um diagnóstico
09/11/2014 - Folha de S.Paulo


Logo ao nascer, Elis, 2, filha da advogada Mônica Bellotto, 38, teve vômito e fezes com sangue. Quase morreu. Foi à UTI e passou por uma cirurgia no abdome, que nada encontrou. Foram 11 meses tensos até o diagnóstico: um tipo raro e grave de alergia.

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Elis nasceu com 38 semanas de gestação, com 49 cm e 3 kg. Na primeira hora de vida, foi diagnosticada com hipoglicemia. Foi levada à UTI.

Deram para ela fórmula infantil, porque não permitiam amamentação na madrugada. Quando ela voltou para o quarto, a orientação foi para que, além do peito, seguíssemos com a fórmula infantil.

No fim daquela noite, Elis regurgitou uma gosma verde, parecia grama ruminada. Meia hora depois, ela regurgitou bile novamente. A pediatra disse que era normal. Tivemos alta no dia seguinte sem nenhuma explicação. A orientação foi para continuar com amamentação no peito e com o leite artificial.

Mas ela mamava e vomitava, mamava e vomitava. No terceiro dia em casa, percebemos raias de sangue nas fezes.

A pediatra suspeitou de uma alergia a uma proteína do leite de vaca. Minha filha urrava e se contorcia muito. Começou a vomitar sangue.

Corremos para o pronto-socorro. Ela chegou ao hospital desidratada, letárgica, em choque. O cocô parecia uma geleia de framboesa. Elis foi levada para UTI. Chamaram um cirurgião pediátrico.

O ultrassom sugeria uma inflamação intestinal extensa. Foi preciso abrir a barriguinha dela. Mas nada foi encontrado além da inflamação.

Ninguém sabia o que minha filha tinha.

Foram dias aterrorizantes. Meu bebê, com uma semana de vida, naquele sofrimento todo. Elis ficou 14 dias recebendo alimentação por meio de um cateter (parenteral). Também tomava fortes antibióticos. Com menos de um mês, minha filha já tinha tomado mais antibiótico do que eu na minha vida toda.

A coisa começou a se normalizar depois que introduzimos uma fórmula de aminoácidos livres. Em casa, montamos uma operação de guerra, mamadeira separadas, buchas e demais apetrechos separados na hora da lavagem.

Ao mesmo tempo, continuamos a investigação. Os sintomas não se encaixavam em nada do que estava descrito na literatura. Fizemos todos os exames possíveis. Estávamos nas mãos da melhor equipe de gastroenterologia do Brasil e ninguém sabia nada.

A introdução de novos alimentos foi com muita cautela. Dava uma banana cozida durante cinco dias e esperava dois, dava pera cozida por cinco dias e esperava dois.

Aos 11 meses, resolvemos fazer o teste de provocação oral no consultório do médico. Duas horas depois do leite sem lactose, Elis começou a vomitar muco, bile e, por fim, sangue.

Minha filha entrou novamente em choque. Chegamos ao hospital com ela desmaiada, branca, lábios roxos.

Saímos de lá com o diagnóstico de APLV [alergia à proteína do leite de vaca] e ficou combinado que esperaríamos mais seis meses para um novo teste de provocação.

Mas esse teste aconteceu dentro de casa mesmo, no susto. A Elis já estava engatinhando e pegou o copo de suco artificial do meu filho mais velho e bebeu. Vomitou, desmaiou e teve choque por desidratação. O suco tinha soja --e aí descobrimos que ela também era alérgica à soja.

Me indicaram uma gastropediatra, e foi ela quem fez diagnóstico: FPIES [Síndrome da Enterocolite Induzida Por Proteína Alimentar]. Comecei a ler tudo o que encontrei, havia pouca coisa na literatura, mas relatos de mães de outros países eram muito parecidos com o caso da Elis. Só vai mudando o alimento envolvido. Abóbora, lentilhas, coco, melão. Coisas que ninguém nunca imaginou.

A dieta da Elis continua bem restrita. A introdução de alimentos tem que ser feita com o maior cuidado. Ovo, por exemplo, ela experimentou no hospital como precaução. Aveia, também. Ela nunca experimentou peixe.

Minha filha hoje tem desenvolvimento normal, a única coisa é que a gente não tem vida social. Temos medo de levá-la a hotel, restaurante ou na casa de amigos.

Pretendo divulgar ao máximo a FPIES. Não quero que nenhuma mãe passe o que passei. A cicatriz que toma toda a barriga de Elis me faz lembrar os dias do terror que vivemos.


Risco de epidemia de dengue é maior em Jaboticabal
08/11/2014 - Folha de S.Paulo


DE RIBEIRÃO PRETO - Entre as dez maiores cidades da região de Ribeirão Preto, Jaboticabal é a que apresenta maior risco de sofrer epidemia de dengue.

É o que mostra o Liraa --índice que mede a presença do mosquito transmissor da doença (Aedes aegypti) em imóveis, atualizado nesta sexta-feira (7).

Ribeirão não aparece no levantamento porque não enviou informações ao Ministério da Saúde. A prefeitura diz que divulgará os dados no dia 15.

São Carlos e Bebedouro também não enviaram informações ao governo federal.

Jaboticabal aparece com índice de 1,8, o que deixa a cidade em estado de alerta.

De acordo com o Ministério da Saúde, o ideal é que o índice fique abaixo de 1 (satisfatório).

De 1 a 3,99, o estado é de alerta. Já acima de 3,99, existe o risco de epidemia.

O índice de Araraquara é de 0,9. Sertãozinho e Barretos têm 0,8, enquanto Matão está com 0,4, e Batatais, com 0,2.


Medicina tradicional chinesa ganha forte apoio no Ocidente
10/11/2014 - Folha de S.Paulo

A medicina tradicional chinesa ensina que algumas pessoas têm a constituição quente, o que as torna propensas a febres e inflamações em certas partes do corpo, e outras tendem a ter o corpo frio e sentir arrepios. Essas ideias enraizadas nas tradições orientais se desenvolveram ao longo de milhares de anos. Mas não encontram muito respaldo em dados científicos.

Pesquisadores em universidades respeitadas da China e cada vez mais também da Europa e dos Estados Unidos estão unindo técnicas ocidentais de análise de sistemas biológicos complexos à noção da medicina chinesa de que o corpo é um todo que funciona como uma rede conectada. A ideia é estudar como os genes ou as proteínas interagem pelo corpo no avanço de uma doença em vez de examinar genes ou moléculas individualmente.

"A medicina tradicional chinesa vê a doença como o mais completo conjunto possível", diz Jennifer Wan, professora da faculdade de ciências biológicas da Universidade de Hong Kong, que estuda a medicina tradicional chinesa, ou MTC. "A medicina ocidental vê os eventos ou os indivíduos como partículas isoladas." Mas, de modo geral, um só gene ou marcador biológico não gera uma compreensão abrangente da doença, diz ela.

Para atingir esse objetivo, a pesquisa sobre a medicina chinesa precisa melhorar. Nos estudos sobre remédios à base de ervas, por exemplo, raramente se espera que os cientistas validem as plantas em estudo, o que dificulta saber o que está incluído nas receitas. Isso também dificulta que outros cientistas repliquem os resultados, diz Qihe Xu, professor de medicina renal do King's College London. Ele coordenou um grupo de 200 cientistas formado para estudar boas práticas de pesquisa em medicina tradicional chinesa, o GP-MTC.

O uso de receitas de ervas na MTC poderia ser validado e padronizado mediante mais estudos científicos e servir de guia para a criação de novas drogas, dizem especialistas. Um exemplo é o trabalho de Yung-Chi Cheng, professor de farmacologia da Universidade de Yale, que analisa uma combinação de quatro ervas, chamada PHY906, para reduzir os efeitos colaterais da quimioterapia. A combinação parece conter mais de 60 substâncias químicas e tem capacidade de reduzir enjoos e diarreia e de ajudar a combater o câncer de cólon.

O campo também precisa criar padrões para as definições e para as formas de monitorar as doenças tratadas pela MTC, importantes para pesquisa e atendimento clínico, diz Xu. Seu grupo, financiado pela União Europeia, publicou em 2013 um conjunto de diretrizes para boas práticas na revista "BMC Complementary and Alternative Medicine", um dos cerca de 50 artigos publicados pelo grupo desde 2010.

Segundo a medicina chinesa, doenças são fruto de desequilíbrios no organismo, provocados por hábitos prejudiciais à saúde no estilo de vida da pessoa e seu ambiente. Sintomas como boca seca ou língua saburrosa são sinais de que certos sistemas corporais não estão em sintonia. Embora esses sinais possam ser ignorados pelos médicos ocidentais mais focados em doenças específicas, os médicos da MTC os usam com frequência como orientação para o tratamento.

Um médico praticante da MTC que sabe se alguém tem síndrome de calor ou de frio poderia usar essa informação como um primeiro indício para tratar doenças que envolvem o sistema imunológico ou metabólico. Entre elas, podem estar a gastrite, artrite reumatoide ou câncer. Algum dia também poderá haver tratamentos eficazes que levem em conta a constituição da pessoa, diz Shao Li, vice-diretor da divisão de bioinformática da Universidade Tsinghua, em Pequim.

Na China é possível encontrar médicos que praticam medicina ocidental e outros que praticam a chinesa. Muitos pacientes procuram médicos ocidentais para determinadas doenças, mais graves, mas buscam orientação da MTC para outras, frequentemente para prevenir doenças.

A MTC foi praticamente ignorada pela medicina ocidental até recentemente, mas está ganhando força entre alguns cientistas e médicos. A Cleveland Clinic, no Estado americano de Ohio, recentemente abriu um centro de terapia com tratamento à base de ervas. O governo americano fundou o Centro Nacional para Medicina Complementar e Alternativa em 1998.

Uma área promissora da MTC que está sendo pesquisada por vários grupos independentes de cientistas é a noção de síndrome de calor e de frio. O trabalho ainda está em fase inicial, mas pode resultar numa nova direção para a pesquisa sobre MTC, usando a abordagem da biologia de sistemas integrada à experiência adquirida com o tratamento de pacientes da MTC, diz Cheng, de Yale, que também atua como presidente do conselho do Consórcio para a Globalização da Medicina Chinesa.

Li, da Universidade Tsinghua, e seus colegas examinaram pessoas com síndrome de calor ou de frio para ver se apresentavam sinais diferentes de doenças, incluindo gastrite, distúrbio digestivo comum em que o revestimento do estômago fica inflamado ou irritado.

Os pesquisadores perguntaram se a pessoa sentia frio em algumas partes do corpo, se preferia bebidas quentes, se era suscetível a resfriados. Os médicos investigaram também o estado emocional dos pacientes, perguntando se tinham os chamados sentimentos "frios", como apatia. Também mediram proteínas vinculadas à gastrite, mensuraram as bactérias no intestino e fotografaram as bactérias na superfície da língua.

Foram encontradas algumas variações entre os pacientes identificados como "quentes" ou "frios", assim como diferenças nas bactérias na língua, correspondentes à cor da película que a reveste e ao diagnóstico do paciente com síndrome de calor ou de frio. Os resultados sugerem que alguns sintomas facilmente detectáveis e não específicos poderiam ser úteis na clínica médica, diz Li. Ainda não se sabe, porém, se os pacientes de gastrite classificados como portadores de síndrome de calor iriam, de fato, apresentar reações diferentes ao mesmo tratamento do que os classificados como frios.

Na Holanda, Jan van der Greef, professor de biociências analíticas na Universidade de Leiden e colegas analisaram a correlação entre a classificação por sintomas de calor ou frio e a artrite reumatoide. Pediram a um especialista em medicina chinesa para identificar os participantes segundo o tipo e estudaram substâncias químicas produzidas pelo organismo ligadas ao sistema imunológico. Foram encontrados níveis mais altos de um esteroide e 11 outras moléculas na urina de pacientes com artrite, dependendo do diagnóstico feito pela MTC.

Isso poderia levar a estratégias diferentes na gestão de doenças. Os pacientes do tipo frio podem se beneficiar mais com tratamentos hormonais como a prednisona, enquanto os do tipo quente podem melhorar com terapias imunológicas, disse Herman van Wietmarschen, pesquisador de pós-doutorado na Organização Holandesa de Pesquisa Científica Aplicada e principal autor do artigo. O trabalho foi publicado na revista "PLOS One", em 2012.


Um risco maior que o ebola.
10/11/2014 - Época


No domingo, a família se diverte reunida. Na segunda-feira e nos dias seguintes, o ânimo desaparece pouco a pouco. A casa toda adoece. Crianças, jovens, adultos, idosos - um após o outro. Alguns se queixam de febre acima de 39 graus, outros de dores de cabeça e manchas vermelhas na pele. Todos padecem de terríveis dores nas articulações dos dedos, tornozelos e pulsos. Elas inflamam e incham. Abrir as mãos para alcançar um copo ou vestir a roupa se torna tão difícil e dolorido quanto vencer uma corrida de longa distância. Os que conseguem dar alguns passos, curtos e lentos, se apoiam em cadeiras, cabos de vassoura, muletas emprestadas pelos vizinhos. Tentam buscar socorro para arrastar até o hospital aqueles que mal conseguem se levantar. Ao chegar lá, descobrem que não são os únicos afetados pelos estranhos sintomas. Centenas de pessoas caíram de cama e disputam os mesmos cuidados.
Essa é a experiência compartilhada nas últimas semanas pelos moradores de Feira de Santana, na Bahia, a cerca de 100 quilômetros de Salvador. Mais de 400 pessoas (409, segundo o último boletim oficial) foram diagnosticadas com uma doença nova no Brasil - a febre chikungunya, causada pelo vírus de mesmo nome. Outros 689 casos suspeitos estão em investigação por lá. A origem da palavra é africana. Na língua maconde, da Tanzânia, onde o vírus foi identificado pela primeira vez, nos anos 1950, chikungunya significa "aqueles que se dobram". É uma referência à postura curvada dos doentes. De uma hora para outra, até os rapazes mais atléticos podem sentir na pele o que é ter 80 anos e sofrer de artrite crônica. Dói bem mais que dengue durante vários dias ou semanas. Em alguns casos, meses.
O vírus consegue infectar muita gente em pouco tempo porque é transmitido por um mosquito bem conhecido dos brasileiros: o Aedes aegypti, o mesmo da dengue. Ao prever um verão com epidemias simultâneas de dengue e de febre chikungunya, o Ministério da Saúde lançou na semana passada mais uma campanha de combate aos focos do mosquito. Desta vez, com um claro alerta: "O perigo aumentou. E a responsabilidade de todos também".
O vírus avança rapidamente pelo Brasil - e pode chegar a todas as regiões nos próximos meses. Em junho, cinco militares que retornaram de uma missão no Haiti receberam o diagnóstico da doença em São Paulo. No bimestre seguinte, surgiram no Brasil 37 notificações de infecção importada. Na maioria dos casos, a doença foi contraída no Caribe. Com a circulação desses viajantes, não demorou muito para que o vírus fosse introduzido definitivamente por aqui. Em setembro, surgiram no município de Oiapoque, no Amapá, as duas primeiras notificações de transmissão em território brasileiro.
De lá, o vírus avançou pelo Nordeste até provocar epidemia na Bahia - a região mais afetada até o momento. No total, o Brasil já tem 824 casos confirmados em 15 Estados. O chikungunya raramente mata. Em 2004, cerca de 60% dos habitantes das Ilhas Reunião, um departamento francês no Oceano Índico, se infectaram. A doença deixou a população debilitada e afetou gravemente a economia. Ninguém podia sair de casa para trabalhar, estudar ou consumir. Houve 266 mil casos e apenas 256 mortes - o que significa uma taxa de letalidade de 0,1%. Mais tarde, na epidemia indiana de 2006, houve 1,3 milhão de casos e nenhuma morte. Os caribenhos, acostumados às agressões do vírus, dizem que o chikungunya não mata, mas aleija.
A doença conhecida como "prima da dengue" se espalha enquanto os brasileiros se preocupam com um inimigo ainda inexistente no país: o ebola (leia a reportagem na página 82). É um erro. O risco de o ebola entrar no Brasil, se instalar e começar a ser transmitido para várias pessoas é mínimo. A dengue - que afeta milhares e causa centenas de mortes todos os anos no país - e o chikungunya são ameaças muito concretas. Só neste ano, o Brasil registrou 556 mil casos de dengue e 379 mortes.
"O chikungunya é um mal anunciado", afirma o epidemiologista Marcos Boulos, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. "Ninguém pegará ebola no Brasil, mas muita gente corre o risco de ter dengue ou febre chikungunya. Não precisa nem morar na periferia." Um levantamento sobre a circulação do Aedes aegypti, divulgado na semana passada pelo Ministério da Saúde, revelou que 44% dos 1.453 municípios participantes estão em situação de alerta ou risco para dengue e febre chikungunya. O trabalho demonstra que 117 cidades, incluindo dez capitais, estão em estado de alerta por causa do alto grau de criadouros encontrados. Segundo o Ministério da Saúde, nesses municípios foram encontrados focos do mosquito em quatro de cada 100 casas visitadas em outubro.
Belém (PA), Porto Velho (RO), Maceió (AL), Natal (RN), Recife (PE), São Luís (MA), Aracaju (SE), Vitória (ES), Cuiabá (MT) e Porto Alegre (RS) são as capitais com maior risco de infestação. A proximidade do verão, com a combinação de chuva e calor, favorece a procriação do mosquito. "Se não agirmos com rapidez, em janeiro teremos até dez casas com foco do mosquito a cada 100 imóveis", afirma Jarbas Barbosa, secretário de Vigilância do Ministério da Saúde. É muita coisa.
Apesar da grande quantidade de criadouros de mosquitos, o número de casos de dengue no Brasil caiu 61% em 2014. Todas as regiões apresentaram queda. A mais acentuada ocorreu no Sudeste, 67%. As mortes caíram 41%. No conjunto dos Estados, o Rio de Janeiro foi o que mais conseguiu reduzir o número de casos de dengue em 2014. As notificações caíram 97% em relação ao ano passado. Em 2008, o Estado viveu sua maior epidemia de dengue. Tendas do Exército foram instaladas ainda inexistente no país: o ebola (leia a reportagem na página 82). É um erro. O risco de o ebola entrar no Brasil, se instalar e começar a ser transmitido para várias pessoas é mínimo. A dengue - que afeta milhares e causa centenas de mortes todos os anos no país - e o chikungunya são ameaças muito concretas. Só neste ano, o Brasil registrou 556 mil casos de dengue e 379 mortes.
"O chikungunya é um mal anunciado", afirma o epidemiologista Marcos Boulos, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. "Ninguém pegará ebola no Brasil, mas muita gente corre o risco de ter dengue ou febre chikungunya. Não precisa nem morar na periferia." Um levantamento sobre a circulação do Aedes aegypti, divulgado na semana passada pelo Ministério da Saúde, revelou que 44% dos 1.453 municípios participantes estão em situação de alerta ou risco para dengue e febre chikungunya. O trabalho demonstra que 117 cidades, incluindo dez capitais, estão em estado de alerta por causa do alto grau de criadouros encontrados. Segundo o Ministério da Saúde, nesses municípios foram encontrados focos do mosquito em quatro de cada 100 casas visitadas em outubro.
Belém (PA), Porto Velho (RO), Maceió (AL), Natal (RN), Recife (PE), São Luís (MA), Aracaju (SE), Vitória (ES), Cuiabá (MT) e Porto Alegre (RS) são as capitais com maior risco de infestação. A proximidade do verão, com a combinação de chuva e calor, favorece a procriação do mosquito. "Se não agirmos com rapidez, em janeiro teremos até dez casas com foco do mosquito a cada 100 imóveis", afirma Jarbas Barbosa, secretário de Vigilância do Ministério da Saúde. É muita coisa.
Apesar da grande quantidade de criadouros de mosquitos, o número de casos de dengue no Brasil caiu 61% em 2014. Todas as regiões apresentaram queda. A mais acentuada ocorreu no Sudeste, 67%. As mortes caíram 41%. No conjunto dos Estados, o Rio de Janeiro foi o que mais conseguiu reduzir o número de casos de dengue em 2014. As notificações caíram 97% em relação ao ano passado. Em 2008, o Estado viveu sua maior epidemia de dengue. Tendas do Exército foram instaladas para dar alguma assistência aos doentes que não conseguiam ser atendidos nos postos e hospitais. Desde então, novas estratégias de controle e prevenção ajudaram a conter o avanço do vírus. "Fatores climáticos, como o baixo índice de chuvas, e a imunização natural da população infectada em epidemias anteriores também favoreceram a queda nos registros", diz Alexandre Chieppe, superintendente de Vigilância Epide-miológica e Ambiental, da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro.
Isso não significa que o Rio, São Paulo e outros Estados densamente povoados estejam livres da ameaça. Como alerta o Ministério da Saúde, o perigo aumentou. Uma das grandes preocupações em relação ao chikungunya é a demanda extra que ele lançará sobre as unidades de saúde que já funcionam com sobrecarga. Não há tratamento específico para a doença. O melhor que os médicos podem fazer é recomendar repouso e ingestão de líquidos, além de aliviar os sintomas com analgésicos e anti-infla-matórios. Como as dores persistem, o paciente volta nos dias seguintes com as mesmas queixas. "Imagine o que acontecerá ao sistema de saúde se a cada dia centenas de pessoas a mais começarem a procurar atendimento em unidades já sobrecarregadas", diz Boulos, da USP. O pior: muitos pacientes ficam debilitados por muito tempo e precisam de várias sessões de fisioterapia - algo raro na rede pública e disputadíssimo nos serviços privados.
Diferentemente da dengue, que tem quatro subtipos, o chikungunya é único. Quem se recupera da infecção tor-na-se imune. Quem já teve dengue não está nem menos nem mais vulnerável ao chikungunya. Apesar dos sintomas parecidos e da forma de transmissão similar, as doenças são provocadas por vírus diferentes. Há uma peculiaridade em relação ao chikungunya. "Ele infecta os mosquitos com mais facilidade que o vírus da dengue. Talvez essa seja nossa grande preocupação para 2015", diz Alexandre Chieppe.
O vírus só pode ser detectado por exames de laboratório. Por enquanto, as amostras são enviadas ao Instituto Evandro Chagas, em Belém, ou a outros laboratórios públicos. Em breve, os particulares também poderão oferecer o serviço. O Fleury Medicina e Saúde trabalha no desenvolvimento de um kit de diagnóstico. O teste deverá ser lançado nas próximas semanas. "Prevemos uma demanda de 100 exames por dia só na cidade de São Paulo", diz o virologista Celso Granato, diretor clínico e responsável técnico do Fleury.
Não existe vacina contra o chikungunya. Em breve, haverá uma contra a dengue. Na semana passada, um estudo publicado na revista The New England Journal of Medicine revelou os resultados promissores de uma vacina desenvolvida pela empresa Sanofi Pasteur. O produto reduziu em 60% os casos de dengue em crianças e adolescentes de 9 a 16 anos. Segundo o laboratório, a vacina também evitou que 80% dos doentes precisassem ser hospitalizados. Não é fácil fazer uma vacina contra a dengue, porque ela é causada por quatro tipos diferentes do vírus. A única empresa que alcançou esse objetivo foi a Sanofi Pasteur. Ela pedirá o registro da vacina no Brasil no primeiro semestre de 2015.
Quando ela estiver disponível, será uma solução apenas para parte do problema. Os imunizados estarão protegidos contra a dengue, mas poderão cair de cama por causa do chikungunya. Não há no mercado nenhuma forma de imunização contra ele, embora uma vacina criada pelos Institutos Nacionais de Saúde (NIH), dos Estados Unidos, tenha se mostrado eficaz em testes com 25 adultos saudáveis. Convencer a população a combater os criadouros dos mosquitos - uma missão historicamente inglória - é mais urgente do que nunca. Vem verão e vai verão, entra campanha e sai campanha, e os depósitos de larvas não diminuem. Os lixões, os pneus velhos, os vasinhos com água parada e as piscinas em casas fechadas continuam onde sempre estiveram. Em tempos de pouca chuva, dividem o papel de cria-douro do mosquito com baldes e bacias destampadas nos quintais. Não há nada mais democrático que um vírus transmitido por mosquito. Para adoecer, não é preciso nem sequer dividir o mesmo ambiente com o infectado. O Aedes aegypti cuida de tudo. Sem respeitar as fronteiras entre os bairros, ele promove a união do sangue de ricos e pobres. ? Cristiane Segatto Dizem que os menores frascos contêm os piores venenos. O provérbio vale para muitas formas de vida - entre elas o vírus ebola, capaz de matar um em cada dois infectados. Ele é altamente letal e, ao mesmo tempo, simples e mirrado. Cada partícula do ebola é composta de apenas seis proteínas agrupadas. Olhando bem, com certa boa vontade, é possível enxergar alguma semelhança entre ele e um fio de espaguete em escala microscópica. Desde que o ebola escapou do controle na África (13 mil infectados e 4.800 mortos - a maioria na Guiné, na Libéria e em Serra Leoa) e bateu às portas dos Estados Unidos e da Europa, os cientistas tentam entender se há algo novo em sua biologia. O vírus mudou? Está mais contagioso? Consegue se multiplicar mais rápido? O que era péssimo pode ficar ainda pior? Parte das respostas começa a sair do laboratório da pesquisadora iraniano-americana Pardis Sabeti, do Broad Institute, na Universidade Harvard. Ela é uma das mais respeitadas investigadoras da genética do ebola. O atual surto começou em dezembro na Guiné e logo chegou à Libéria. Assim que o vírus alcançou Serra Leoa, Pardis foi procurada por colaboradores que trabalham na cidade de Kenema. A equipe de Pardis decidiu começar a decifrar o genoma do vírus o mais rápido possível. Sem o estudo dos genes, não é possível criar novos testes de diagnóstico, vacinas ou remédios promissores, como o ZMapp, o soro em desenvolvimento nos Estados Unidos que parece ter sido o responsável pela recuperação do médico americano Kent Brantly, infectado na Libéria.
No início de junho, amostras de sangue extraídas de doentes africamutações não surpreende. Faz parte da natureza dos vírus. O que interessa, no caso do ebola, é saber se essas modificações terão conseqüências sobre o controle da epidemia. No pior cenário, imaginado por quem sente atração por enredos apocalípticos, as mutações ;ar ainda pior? sistente, mas dificilmente será transmitido pelo ar poderiam criar um supervírus, capaz até mesmo de ser transmitido pelo ar. As pesquisas realizadas nos melhores laboratórios do mundo revelam que isso não passa de especulação.
Não há notícia, em mais de 100 anos de estudos de virologia, de um vírus tas obtiveram vírus que simplesmente perderam a capacidade de matar.
Não é fácil ser infectado pelo ebola. Isso só acontece quando há contato com fluidos corporais do doente -como sangue, lágrima, suor, vômito, sêmen etc. O ebola não é como o in-fluenza, o vírus da gripe, que consegue percorrer longas distâncias suspenso no ar. Os estudos genéticos realizados pela equipe de Pardis comprovaram que as mutações sofridas pelo ebola não são suficientes para alterar o conjunto de genes mais importantes - aqueles que conferem a própria identidade do vírus. Uma das características básicas dessa identidade é depender de fluidos corporais para ser transmitido.
"Perguntar se o ebola pode ser transmitido pelo ar é como perguntar se as zebras podem se espalhar pelo ar", disse Eric Lander, diretor do Broad Institute, à revista New Yorker. Segundo ele, essa é uma questão errada, porque ignora o estilo de vida que permitiu a própria existência do vírus. "Mais inteligente seria perguntar se as zebras podem aprender a correr mais rápido", afirmou. Existem várias formas pelas quais o vírus poderia se tornar mais contagioso sem que, para isso, precisasse ser transmitido pelo ar. A forma clássica é tornar-se menos letal. Por mais paradoxal que pareça, essa é uma regra da natureza. Todo e qualquer vírus só quer saber de crescer e se multiplicar. Os mais "espertos" não matam sempre ou matam devagar. Com isso, têm tempo de infectar muitas pessoas antes de ir para a sepultura com o doente. Em surtos anteriores, o ebola chegou a matar até 90% dos infectados - uma tragédia para o ser humano e também para as populações virais, contidas com muito mais facilidade.
No surto atual, o ebola não mata com tanta freqüência. A taxa de ? causador de doença em humanos que tenha mudado seu modo de transmissão. Os cientistas até tentaram criar esse efeito em experiências controladas. Fracassaram sempre. Ao induzir mudanças genéticas que poderiam facilitar a transmissão pelo ar, os cientisletalidade varia entre 40% e 90%, dependendo da região e dos recursos para tratar os doentes. Se o vírus estiver matando menos porque os infectados receberam hidratação adequada e outros paliativos ou porque o organismo dos doentes resistiram ao ataque, a notícia é boa. Se o ebola estiver se tornando menos letal por uma estratégia de sobrevivência biológica dele mesmo, a notícia é péssima.
Por enquanto, não se sabe. "É possível que o vírus esteja se replicando mais rapidamente que no passado", diz o cientista Peter Jahrling, do National Institute of Allergy and Infec-tious Diseases, em Washington. Isso significa que pode haver mais partículas virais em cada gota de fluido corporal. Isso aumentaria o risco de contaminação de um número maior de pessoas. O ebola já é um vírus altamente infeccioso. Apenas um quinto de uma colher de chá de sangue pode conter 10 bilhões de partículas virais. Uma ínfima quantidade delas já é capaz de infectar quem tem contato com fluidos corporais do doente - daí a necessidade de usar vestimentas duplas, óculos, máscaras e luvas sobrepostas para cuidar dos pacientes.
Existe outra preocupação. Que, ao sofrer mutações, ainda que leves, o ebola se torne irreconhecível a nossas defesas. Até o momento, os sortudos que sobrevivem ao ebola não se infectam novamente pelo mesmo vírus. Eles se tornam imunes. Se as proteínas do vírus sofrerem alterações, eles poderiam voltar a se infectar. Seria terrível não só para eles. Significaria que as vacinas e os tratamentos em desenvolvimento deixariam de fazer efeito. Esse tipo de mutação não é incomum, segundo a geneticista Pardis. "Há alguma evidência de que as proteínas do ebola possam estar mudando", afirmou Pardis ao jornal The New York Times. Apesar disso, ela e outros cientistas afirmam que não há nenhuma evidência de que o vírus já tenha sofrido alterações significativas.
Alterações biológicas podem ter contribuído para que o atual surto na África não fosse controlado rapidamente como nos episódios anteriores. Certamente, elas não são a causa principal da tragédia. O ebola não teria matado tanta gente nem escapado da África se os países ricos e a Organização Mundial da Saúde (OMS) tivessem ouvido os apelos de pesquisadores e profissionais de saúde que vivem a rotina dos países afetados. É o caso do grupo Médicos Sem Fronteiras (leia o depoimento na página 86), um dos primeiros a prever que o surto sairia do controle.
A previsão atual da OMS é sombria. Em dezembro, poderá haver 10 mil novas infecções por ebola a cada semana, se os esforços de controle nos países mais afetados (Guiné, Libéria e Serra Leoa) não forem ampliados. "A atual epidemia de ebola é paradoxal: está fora de controle, ao mesmo tempo que é facilmente controlável", escreveu o economista Jeffrey Sachs, professor da Universidade Columbia e consultor das Nações Unidas, em artigo publicado em outubro na revista científica The Lancet.
O fundamental para o controle da epidemia é garantir diagnóstico rápido, isolamento e tratamento adequado dos doentes. Sachs argumenta que esses passos conhecidos não foram realizados a tempo no surto atual. Segundo estimativas do governo americano, cerca de 60% das infecções na África Ocidental continuam sem diagnóstico. Se cada doente pode transmitir o vírus a até oito pessoas, os epidemiologistas preveem centenas de milhares de casos em meados de 2015. Ainda assim, é possível evitar o pior. Segundo Sachs, a epidemia poderá ser controlada nos próximos seis meses, desde que os países recebam o básico do básico: diagnóstico rápido, transporte seguro, isolamento dos doentes e tratamento. Exatamente aquilo que deveria ter sido oferecido desde dezembro, quando o primeiro caso surgiu na Guiné. ? 84 ÉPOCA 10 de novembro de 2014 Foto: Stringer/Reuters Cheguei à Guiné em março deste ano, três dias depois de o governo reconhecer a epidemia de ebola, antes de as pessoas se darem conta. O surto começou lá. íamos de picape 4x4 por trilhas na mata para buscar as pessoas em vilas isoladas e informar sobre prevenção. Às vezes, o carro atolava e tínhamos de encontrar outro caminho. Tentávamos nos aproximar do líder da aldeia para explicar o trabalho. Havia muita desconfiança. Antes de o ebola chegar, não acreditavam que a doença existia. Achavam que mentíamos, mesmo ouvindo as notícias no rádio. Os curandeiros locais diziam: "Eu curo ebola". As tradições são muito fortes. Aí a gente precisava explicar que, infelizmente, muitos curandeiros morreram por causa do contato direto com doentes. Para facilitar a aproximação com os moradores, convidávamos os chefes locais a visitar nosso centro de tratamento. Em Uganda, onde já houve uma epidemia antes, a aceitação é muito mais rápida.
Voltei por um mês ao Rio de Janeiro, depois fui a duas missões em Serra Leoa. Lá, quando um paciente chegava a nosso centro de tratamento, havia uma triagem. Ele passava por um questionário para ver se era sus peito de ter ebola. Ficávamos separados fisicamente do paciente por uma cerca dupla, a 2 metros dele. Se tivéssemos de carregá-lo, não tinha jeito, tínhamos de vestir a roupa toda e atendê-lo para fazer a admissão. Ele recebia toalha, roupa de cama e escova de dentes. A área dos casos suspeitos ficava separada da ala dos casos prováveis e da ala dos casos positivos. Colhíamos sangue. Só os profissionais mais experientes faziam esse trabalho, de risco. O resultado saía em três ou quatro horas, e só 20% dos que entravam não eram positivos.
Tínhamos 50 a 60 pacientes, em 12 tendas - e chegavam dez, 15 novos por dia. Os que sobreviviam ficavam de duas a três semanas inter _ nados. A maioria dos óbitos acontecia em quatro dias, em média. A partir do décimo dia, ou os sintomas melhoravam ou começavam a piorar - no segundo caso, o paciente dificilmente sobrevivia. Todo dia morria gente: num dia, um, dois; em outro, cinco... Muito paciente saía curado. Nossa taxa de cura era de 47%, enquanto, em termos gerais, a taxa de mortalidade é de 70%. Os sintomas do ebola são parecidos com os da malária. Diminuía muito a chance de sobrevivência de quem ? 86 : ÉPOCA IO de novembro de 20)4 FouEduadoZwa/CPOCA tinha malária também. Por via das dúvidas, todo paciente recebia tratamento de malária.
Em abril, tivemos de evacuar o centro de tratamento, porque um grupo de uma comunidade atacou a pedradas o hospital e um de nossos carros. Queriam queimar o material. Saímos corridos do hospital, num comboio de quatro carros, fugindo por uma trilha no mato. Diziam que estávamos lá para vender sangue, gordura, sabe-se lá o quê. Veio um pessoal de moto atrás da gente. Quando conseguimos nos desvencilhar deles, o pneu de um carro estourou... Escapamos e só voltamos para lá depois de contatar os militares e a polícia. Foi tenso.
Muita gente se contaminava em funerais, porque há a tradição de encostar muito, abraçar, beijar, e o momento da morte é o de maior transmissão. Passamos a fazer funerais seguros, em que a equipe dos Médicos sem Fronteiras vai ao lugar e cuida do corpo, prepara tudo, com sacos mortuários duplos para evitar infecção. Um funcionário local nosso se contaminou e houve certo pânico. Por insegurança, muitos profissionais saíram. Não me senti mais inseguro lá do que em outros lugares onde já atuei, porque 0 protocolo e a proteção são muito rígidos. Ver tantas mortes é duro, mas me acostumei gradativamen-te. Claro, é uma situação tensa, de cansaço, preocupação. Os Médicos sem Fronteiras têm uma estrutura de atendimento. Quem quiser pode conversar com psicólogos, tanto em trabalho de campo quanto fora.
Há situações que sensibilizam. Recebemos uma menina, Isatta, de 1 ano e 9 meses. Ela chegou depois de uma viagem de seis horas numa ambulância cheia. Não tinha sintomas de ebola, mas o pai e a mãe estavam doentes. O pai morreu, a mãe morreu, a avó morreu, a família toda, e ela ficou no centro de tratamento, sozinha, doentinha. Pensamos: "Como faremos?" Pegamos uma caixa de gerador, de cerca de 1 metro quadrado, forramos como se fosse um berço, botamos uns brinquedos, e ela ficou lá. Passou a ser chamada de "o bebê da caixa". Toda as noites, uma médica trocava a fralda dela. Fizemos uma escala específica para cuidar dela. A menina melhorou e tentou "escapar" duas vezes. Saiu da caixa e correu para fora da cerca. Depois, começou a interagir com outras duas crianças, de 8 e 7 anos, que passaram a cuidar dela e a brincar juntas. Ela recebeu alta e vive com uma família de sobreviventes da epidemia. Ouvi dizer que um dos enfermeiros locais vai adotá-la.
Quando alguém tem alta, ganha um diploma assinado pelo governo e por nós, atestando que não oferece nenhum risco. Nossa equipe vai com eles até sua vila e, na frente de todos, damos parabéns. Fazemos questão de apertar a mão, para mostrar isso claramente. No começo era uma festa, a gente se emocionava, especialmente quando o paciente saía depois de três semanas - você já o conhece pelo nome. Depois muita gente teve alta, e isso passou a ser mais normal.
Ao voltar ao Brasil, passei pelo período de observação de 21 dias - período máximo de incubação -, com controle da temperatura duas vezes por dia, mas vida normal. Se não há sintomas, não há perigo nenhum de transmissão. Não acredito que exista risco de epidemia de ebola no Brasil. Pode haver casos isolados, importados de outros países. Mas não seria um problema de saúde pública, porque existe uma estrutura, e o governo tem um plano de ação.
No meu início nos Médicos sem Fronteiras, amigos diziam que eu era maluco, que amarrariam meu pé na cama para eu não ir, mas já se acostumaram. Eu vinha passando mais ou menos metade do ano em missões, agora reduzi. Já passei por situações de risco, mas não é comum. Não se pode entrar armado em nenhuma instalação do Médicos sem Fronteiras. Mesmo no Afeganistão, a polícia respeitava e deixava a metralhadora na entrada, no armário, e ganhava uma chave. Há momentos tensos, como quando houve tiroteio no local em que trabalhávamos na Somália. Em geral, temos uma relação boa com todos por nossa neutralidade.
A motivação desse trabalho são as pessoas. Você vê o impacto que sua ação pode ter, sente que faz algo útil. Mas não sou eu, é a equipe dos Médicos sem Fronteiras, a ação organizada, estruturada. Às vezes o que fazemos significa salvar uma vida, outras dar uma condição de vida melhor, não deixar alguém ficar com seqüelas, para que possa voltar a ganhar a vida. Nesta semana, volto para a Guiné e continuo meu trabalho. ?



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