Revista 108 - Especial

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PUBLICAÇÃO DO CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Nº 108 - AGO - SET - OUT / 2012

Revista 108 setinha Especial


Mais resultados, menos custos

Experiências bem-sucedidas de farmacêuticos no setor público indicam que a presença desse profissional contribui para melhorar a gestão, ampliar o atendimento e a segurança do paciente, além de reduzir despesas

III Seminário de Saúde Pública: estímulo do CRF-SP à troca de experiências sobre assistência farmacêutica nos municípios (Foto: Chico Ferreira / Agência Luz)
III Seminário de Saúde Pública: estímulo do CRF-SP à troca de experiências sobre assistência farmacêutica nos municípios (Foto: Chico Ferreira / Agência Luz)

Queda de quase 60% nas despesas decorrentes da judicialização de medicamentos no SUS. Melhor distribuição logística e da gestão dos estoques. Redução dos problemas da falta de fármacos nos postos de saúde. Melhora nos processos licitatórios. Ampliação do uso racional de medicamentos. Humanização no atendimento.

Esses são apenas alguns dos resultados obtidos por municípios que acreditaram e investiram na ampliação da assistência farmacêutica no serviço público de saúde, como são os casos de São Bernardo do Campo, Ribeirão Preto, Mauá e São José do Rio Preto. As experiências exitosas dessas cidades foram relatadas durante o 3º Seminário de Saúde Pública: Gestão na Assistência Farmacêutica, promovido em setembro pelo CRF-SP, em São Paulo, e que teve o objetivo de discutir a contribuição do farmacêutico ao serviço público de saúde.

O debate foi realizado justamente num momento que cresce a adesão dos municípios à legislação que determina a presença do farmacêutico no SUS. As experiências mostram que a adoção efetiva da assistência farmacêutica traz benefícios reais à gestão municipal.

Oficina de planejamento estratégico da Assistência Farmacêutica do município de Mauá (Foto: Arquivo pessoal)
Oficina de planejamento estratégico da Assistência Farmacêutica do município de Mauá (Foto: Arquivo pessoal)

"A reestruturação da assistência farmacêutica em Mauá possibilitou o trabalho em conjunto com o Ministério Público e Poder Judiciário. Dessa forma conseguimos reduzir em 59,4% as despesas do município decorrentes das ações de judicialização de medicamentos no SUS", relata a dra. Melissa Sproesser, que coordenava a Assistência Farmacêutica da Secretaria Municipal de Saúde. Segundo ela, graças ao trabalho dos farmacêuticos, foi possível convencer a Justiça de que muitos dos pedidos não se justificavam porque havia medicamentos compatíveis no REMUME (Relação Municipal de Medicamentos Essenciais) e que a substituição não traria prejuízos ao paciente. "O trabalho integrado à assessoria jurídica do município possibilitou aos farmacêuticos se aproximarem da Justiça, passando segurança ao promotor e ao juiz. Eles querem o atendimento do paciente e o farmacêutico quer o mesmo, e isso pode ser feito dentro de parâmetros adequados para o paciente e para a municipalidade".

Graças à ação dos farmacêuticos, o município foi premiado por dois anos consecutivos com o Prêmio Nacional de Incentivo à Promoção ao Uso Racional de Medicamentos, concedido pelo Ministério da Saúde. Essa, entre outras ações que contribuíram para o uso racional de medicamentos, estimulou a prefeitura a ampliar a assistência farmacêutica, que começou com dois profissionais farmacêuticos e, hoje, já conta com 24.

MEDICAMENTOS ADQUIRIDOS PELO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO, SEGUNDO MODALIDAE DE COMPRA (2º quadrimestre de 2012) (Fonte: Secretaria Municipal de Saúde de São José do Rio Preto / Arte: Ana Laura Azevedo)

Em São José do Rio Preto, a atuação dos farmacêuticos trouxe melhoras efetivas à população. Segundo a dra. Carmem Lígia, chefe do departamento de Assistência Farmacêutica da Secretaria Municipal de Saúde, o departamento de Assistência Farmacêutica foi criado no município em 2009 e, desde então, foram estabelecidas metas que reestruturaram todos os processos para garantir acesso aos medicamentos e seu uso racional. "A presença dos farmacêuticos nos processos de gestão tem garantido a dispensação de medicamentos corretos e em tempo adequado para, em média, 98% dos pacientes do sistema público".

Segundo a farmacêutica, foi implantado um sistesistema de logística e controle de distribuição de medicamentos pelos postos de saúde para que 80% das solicitações de produtos ocorressem dentro da previsão normal de consumo.

Foram desenvolvidos alguns mecanismos de controle e planejamento que possibilitam que cada unidade de saúde faça uma previsão real de consumo, que não gere acúmulos desnecessários e nem falta de medicamentos. O objetivo é evitar o desabastecimento e também os altos custos de compras avulsas e entregas não programadas. "Se alguma unidade de saúde começa a pedir medicamentos fora da programação, uma equipe verifica o que está ocorrendo. Pode ser, de fato, uma sequência de imprevistos, mas também pode ser alguma dificuldade de planejamento. Nesse caso, procuramos corrigir o problema. Hoje, mais de 96% das compras de medicamentos ocorrem por pregão eletrônico."

Mudança de cenário

Antes de 2009, somente 27% da verba da assistência farmacêutica estava sendo utilizada em São Bernardo do Campo. Havia problema nas licitações, na distribuição aos postos de saúde, sem contar que, nos postos, havia mais entrega do que dispensação dos medicamentos. A maioria dessas atividades estava centrada na Secretaria de Administração e era realizada por pessoas sem conhecimento específico da área.

Mas o trabalho dedicado de um grupo de farmacêuticos iniciou a mudança nesse cenário. As licitações começaram a ter acompanhamento e a orientação técnica desses profissionais, que também passaram a coordenar a distribuição, os estoques e, principalmente, a dispensação nos postos de saúde.

"Foi difícil, mas o trabalho foi reconhecido. A partir de 2009, graças aos resultados alcançados, a assistência farmacêutica entrou no organograma da Secretaria Municipal de Saúde. Ganhar esse respeito e visibilidade foi uma conquista e tanto", comemora a dra. Eliane Cortez, coordenadora da Assistência Farmacêutica de São Bernardo do Campo, que compõe uma equipe de 38 farmacêuticos municipais. 

Humanização do atendimento em Ribeirão Preto: balcão com vidro dá lugar ao contato direto com o paciente (Foto: Arquivo pessoal)
Humanização do atendimento em Ribeirão Preto: balcão com vidro dá lugar ao contato direto com o paciente (Foto: Arquivo pessoal)

O uso racional de medicamentos e o atendimento aos pacientes, em especial os de baixa formação educacional, é uma das atividades que têm gerado reconhecimento aos profissionais do município. "Para garantir o uso racional e o tratamento eficaz, temos o exemplo de farmacêuticos que fornecem etiquetas com desenhos aos pacientes que sentem dificuldades em entender como utilizar o medicamento corretamente. Cada etiqueta tem um desenho que orienta quanto à finalidade do produto e o horário de uso. Isso tem trazido bons resultados e humanizado o atendimento." A humanização do atendimento farmacêutico é uma das principais metas da Secretaria Municipal de Saúde de Ribeirão Preto, conta a dra. Darlene Caprari Pires, farmacêutica e secretária-adjunta, que começou a implantar a Assistência Farmacêutica no município em 1988. "No começo, era somente eu de farmacêutica na saúde pública de Ribeirão. Hoje, são quase 60 profissionais. O segredo é trabalhar com as políticas de medicamentos e de assistência farmacêutica inseridas em uma política de saúde que busca o bem-estar das pessoas e os interesses da saúde pública em primeiro lugar."

Graças ao trabalho pioneiro da profissional, a assistência farmacêutica se fortaleceu no município e, aos poucos, ficou responsável por todo o processo de gestão e dispensação de medicamentos. Hoje, o desafio está em aproximar o farmacêutico da população e tornar o atendimento humano e eficaz.

A secretária-adjunta de saúde explica que fazer o acolhimento não é cumprimentar o paciente, mas sim dar resposta efi ciente ao seu problema. Não é só falar: "Eu fiz tudo que podia, mas seu remédio não chegou". Humanizar é resolver o problema do paciente, ser referência de atendimento para as pessoas.

Para ela, o setor público é movido (ou engessado) por regras, normas e leis. O objetivo da orientação não é desrespeitar as regras, pois muitas vezes as normas "recomendam", mas não impõem um determinado procedimento, logo a recomendação deve ser seguida, mas ela deve ficar em segundo plano caso o problema de saúde a ser resolvido fale mais alto. "Queremos evitar, por exemplo, que uma paciente deixe de receber um anti-hipertensivo, um medicamento de controle de diabetes ou um anticoncepcional, simplesmente porque não conseguiu passar naquela semana por uma consulta médica. As normas burocráticas não podem se sobrepor à necessidade do paciente."


Davi Machado

 

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